Miniaturas - Gonçalves Crespo


Gonçalves Crespo

MINIATURAS

ALGUÉM

Para alguém sou o lírio entre os abrolhos,
E tenho as formas ideais de Cristo;
Para alguém sou a vida e a luz dos olhos,
E, se na Terra existe, é porque existo.

Esse alguém, que prefere ao namorado
Cantar das aves minha rude voz,
Não és tu, anjo meu idolatrado!
Nem, meus amigos, é nenhum de vós!

Quando, alta noite, me reclino e deito,
Melancólico, triste e fatigado,
Esse alguém abre as asas no meu leito,
E o meu sono desliza perfumado.

Chovam bênçãos de Deus sobre a que chora
Por mim além dos mares! esse alguém
É de meus olhos a esplendente aurora;
És tu, doce velhinha, ó minha mãe!

O ROSÁRIO

Quando à noite contemplo taciturno
estas contas antigas, o rosário
das minhas orações,
vejo em minhalma o poema legendário
dos velhos tempos das longínquas eras
de santas devoções.

A cruz ebúrnea, onde agoniza o Cristo,
é de um lavor subtil que nos revela
um génio magistral,
obra de monge em merencória cela,