Caravana - Stephen Goldin 2 стр.


Era a Missão de San Fernando, um dos santuários estabelecidos no século XVIII pelo Padre Junípero Serra que veio a ser chamado El Camino Real. Como uma Igreja Católica, ela representava uma das poucas organizações ainda em funcionamento no mundo de hoje. A missão agia como um ponto de distribuição de alimentos, provavelmente alimentando os indigentes como parte de seu trabalho de caridade. Isso era o que tinha levado o enxame de pessoas pobres a mover-se até o parque do outro lado da rua.

Peter tinha sentimentos mistos sobre as igrejas. Não sendo ele religioso, costumava desconfiar delas. É verdade que elas estavam fazendo um trabalho bom agora, fornecendo não apenas cuidados materiaiscomo a distribuição de comidamas também cuidando das necessidades espirituais das pessoas e mantendo o moral alto. Como a situação ficou progressivamente pior, as pessoas apelavam cada vez mais à religião como fonte de conforto. Isso foi bom até certo ponto, mas Peter não podia deixar de recordar como a igreja medieval tinha crescido em um monólito entorpecido, incentivando a superstição e esmagando implacavelmente toda individualidade. Se for para a Humanidade crescer novamente, a liberdade de pensamento seria uma necessidade absoluta. Peter tinha medo que as igrejas estivessem trazendo um alívio de curto prazo e uma opressão de longo prazo.

Peter parou fora da missão e desceu da bicicleta. Esta era sua melhor perspectiva para passar a noite. Ele poderia se alimentar na missão e depois passar a noite sentado contra a parede. As noites podem ser geladas em Los Angeles, mas normalmente não eram insuportavelmente frias. Um dos seus poucos pertencesalém do dinheiro, que nem sempre era útilera o cobertor enfiado na sua mochila. Isto seria suficiente para mantê-lo aquecido esta noite.

Começou a empurrar sua bicicleta para a missão quando notou algo acontecendo em uma rua a oeste da parede do edifício. Um homem negro com uma moto estava sendo incomodado por um bando de jovens brancos.

Eu acho que ele é de Pacoima, um dos baderneiros estava dizendo. Vindo aqui para nos espiar, descobrir quais são nossos pontos fracos. Provavelmente ele e seus amigos querem fazer uma pilhagem de gasolina esta noite. E então, brilhoso, onde conseguiu a motoca?

O negro era jovem, alto e angular; em dias mais felizes, poderia ter sido um jogador de basquete. Ele vestia uma camisa regata vermelha, calça azul e uma bandana também vermelha na testa. O seu rosto era adornado com um nítido cavanhaque e bigode pretos e era coberto por uma juba curta de cabelos encaracolados. Expressava um olhar digno e ardente. Toque nessa moto, disse ele, e eu vou esculpir o Gettysburg Address3 em seu traseiro branco. A sua voz era tão tranquila, quase inaudível, mas ainda tinha um sentimento de força nela.

O bando ficou surpreendido por um instante, e então começaram a rir nervosamente. Eram nove contra um. Quem você pensa que é, nego, vindo aqui e dando ordens?, perguntou o líder, movendo um passo mais perto. O resto do bando fez o mesmo.

Em um movimento rápido, o negro foi a seu bolso das calças, puxou um canivete e abriu a lâmina. A sua mão movia em um pequeno círculo na frente dele, dando a aparência de que a lâmina estava flutuando sozinha. Não são ordens, disse ele. apenas bons conselhos.

Os baderneiros pararam novamente. As coisas estavam ficando quentes e eles estavam incertos sobre o que fazer. O líder estava na pior situaçãoele não queria amarelar na frente de seus companheiros. Assim, após olhar o canivete por um momento, ele calmamente foi a seu cinto e puxou sua própria arma, uma baioneta do exército montada numa haste de madeira. "Se você quer brincar, nós podemos lhe fazer companhia, não é pessoal?" Inspirados pelo seu comportamento, os outros pegaram suas facas.

Peter olhou ao redor. Ninguém no parque estava em uma posição para ver o que estava acontecendo. Se estavam, ignoravam muito bem. Sentiu uma sensação de embrulho em seu estômago e o cuspe em sua boca azedou. Verificou que a sua própria faca estava solta na sua bainha, para o caso de ser necessário.

O bando foi circulando sua presa, mas com menos confiança do que poderia sentir idealmente. A prospectiva vítima não era um impotente forasteiro assustado por seu bullying, mas um homem de aparência poderosa com uma faca afiada e um aparente conhecimento de como usá-la. A gangue avançou com cautela.

O negro ficou parado no lugar, rodando lentamente para manter um olho nas pessoas por trás dele bem como àquelas em frente. A sua faca preparada e apontada diretamente para a garganta do líder.

Com um berro alto, semelhante a um touro, o líder foi para cima. O negro evadiu com facilidade e rapidamente moveu seu punho naquilo que parecia um movimento sem muito esforçoainda assim, quando o líder se endireitou novamente, Peter pôde ver que um profundo corte tinha trespassado sua orelha esquerda, que sangrava profusamente. Próximo, disse o negro, rindo.

Três outros atacaram a partir de direções diferentes. Um recebeu um chute rápido na virilha que o fez dobrar-se de dor; o segundo encontrou apenas o ar quando a vítima já havia se deslocado para causar um golpe na mão do terceiro. Vamos lá, gritou o líder da gangue de um canto mais afastado. O que somos? Um bando de frangotes? Peguem ele!

Todos eles convergiram de uma só vez, embora mostrando um grande respeito pelas proezas da sua vítima. O negro tinha um maior alcance do que a maioria deles e foi capaz de mantê-los momentaneamente à distância com seus cortes, mas ele não podia durar para sempre contra os seus números superiores.

Peter não era um bom lutador, embora tivesse mais do que a sua quota de prática ao longo do último ano. Ele geralmente evitava brigas se pudesse, mas esta foi uma que ele não podia ignorar se quisesse viver com a sua consciência limpa. Sacando a sua faca e emitindo um grito alto, ele correu para frente.

A gangue foi surpreendida por este ataque a partir de um novo sentido e travou por um momento, dando Peter uma vantagem que precisava muito. Ele incapacitou um dos inimigos com uma punhalada rápida na lateral, sob as costelas. Virando para o próximo homem, golpeou na altura da face, cortando um pouco acima da sobrancelha. Sangue vazou do corte para dentro do olho, cegando o sujeito e fazendo com que ele pensasse que seu olho tivesse sido vazado. O baderneiro caiu no chão, aos gritos.

O negro não hesitou como seus atacantes. A sua faca estava ocupada cortando seus adversários, fazendo-os lutar defensivamente. Mas agora eles tinham se recuperado da surpresa do ataque de Peter e lançaram uma contraofensiva própria. Peter encontrou-se enfrentando dois tipos grandes ameaçadores com homicídio em seus olhos. Sem o elemento de surpresa do seu lado, os dois baderneiros eram sem dúvida os melhores combatentes. Peter afastou-se deles lentamente até que descobriu que a suas costas estavam contra a parede da missão. Os outros dois continuavam se aproximando dele, sorrisos maldosos em suas faces.

O que estava à sua esquerda arremeteu-se contra ele. Peter tentou girar para longe, mas não foi rápido o suficientea faca do atacante cortou a parte superior do seu braço esquerdo, enviando uma onda de dor através de seu corpo. O sangue brotou, colorindo sua já encardida camisa, mas teve pouco tempo para se preocupar com issolutava por sua vida.

Seu giro o colocou em uma má posição, porque agora tinha o seu lado esquerdo para fora e o seu lado direitojuntamente com a sua facacontra a parede. Peter teve que se abaixar rapidamente quando o segundo invasor, vendo a abertura, fez um golpe perigoso em direção a sua cabeça. A lâmina assoviou apenas um quarto de polegada sobre seu cabelo.

Seu giro o colocou em uma má posição, porque agora tinha o seu lado esquerdo para fora e o seu lado direitojuntamente com a sua facacontra a parede. Peter teve que se abaixar rapidamente quando o segundo invasor, vendo a abertura, fez um golpe perigoso em direção a sua cabeça. A lâmina assoviou apenas um quarto de polegada sobre seu cabelo.

No entanto, ao fazer o golpe, o jovem ficou com a guarda aberta. Peter avançou e deu-lhe uma estocada na barriga do atacante. O homem soltou um grito de dor e encolheu-se lentamente no chão. Peter com agilidade puxou sua lâmina e rolou no chão para escapar do primeiro atacante, que vinha para cima dele outra vez.

Quando ficou em pé viu o homem diante dele em uma posição agachada de combate. Circularam um ao outro por breves momentos, então o sujeito atacou. Peter tentou dar uma de Matador4, evadindo o ataque e aparando a investida, mas foi apenas parcialmente bem-sucedido. A faca do baderneiro cortou através de sua camisa e arranhou as costelas do lado esquerdo. Peter girou o corpo e tomou distância.

O jovem, sentindo uma presa fácil, atacou de novo. Contudo, ele chegou a apenas meio caminho de Peter. Gritando ele caiu para frente. Um canivete estava enfiado em seu pescoço.

Peter olhou em sua volta, estudando o campo de batalha. Sete corpos estavam espalhados no chão, a maioria deles vivos, mas gravemente feridos. Os dois membros da gangue restantes fugiam descendo a rua. No centro da devastação, o homem negro admirava sua obra com calma. Parecia incólume. Com um sorriso direcionado a Peter, ele aproximou-se e puxou seu canivete da garganta da última vítima, limpou-o na camisa do homem, dobrou a lâmina e o enfiou de volta em seu bolso. Então, ele caminhou para a sua moto, preparando-se para partir.

Ei, disse Peter, você não vai me agradecer?

O negro virou-se. Agradecer? Pelo que? Por fazer algo que qualquer um com coragem deveria ter feito?"

Mas não foi qualquer um, fui eu e estou sangrando.

O negro aproximou-se, agarrou bruscamente o braço esquerdo ferido de Peter e examinou-o. Merda, cara, essa ferida não é nada. Ela vai curar, a menos que infeccione. Ele parou com uma ideia que lhe ocorreu. Você vive aqui?

Peter balançou a cabeça negativamente.

Ah, um stoner, né? Peter detestava essa expressão. Desde que o Colapso tinha começado, muitas pessoas haviam deixado suas casas e foram levadas a vagar, procurando por um lugar melhor do que aqueles que deixaram. Supostamente o termo "stoner" tinha surgido porque essas pessoas foram descritas como "rolling stones," mas Peter suspeitava de que a palavra era também uma brincadeira com seu sobrenome.

Veja bem, o homem prosseguiu, gostaria de estabelecer-se em um lugar pacífico, onde não há escassez e todos trabalham em conjunto?

Peter olhou para ele com desconfiança. Claro, quem não gostaria? Só que onde você vai achar um lugar como esse? É no seu quintal por acaso?

Não banque o engraçadinho, cara, fiz uma pergunta legítima.

E eu disse que sim.

Qual é o seu nome?

Peter Smith. A mentira veio por reflexo agora.

O negro estendeu sua mão. Kudjo Wilson. Eles bateram as mãos em vez de sacudi-las. Ouça, se você realmente deseja ir para algo melhor do que tudo isto, e gesticulou de uma forma que mostrasse o parque repleto de carcaças de carros, Acho que será melhor você ter uma conversa com o meu chefe.

Peter deu de ombros. Mal não vai fazer, eu acho. Onde está ele?

Ah, ele ainda está há algumas milhas daqui. Se quiser, você pode subir na garupa que eu levo você até lá imediatamente.

Peter balançou a cabeça negativamente. Desculpe, mas tenho uma bicicleta que eu prefiro não deixar para trás e não podemos levá-la conosco na moto.

É mesmo. Kudjo pensou por um minuto. Seguinte: Vou de moto na frente e contarei a meu chefe sobre você. Ele passará por aqui de qualquer forma, ou aqui por perto. Por que você não espera junto a rodovia, aquela lá. Ele apontou mais a leste. Fica duas ou três quadras naquela direção. Você espera antes da ponte da passarela, na face sul. Você tem um relógio?

Peter balançou a cabeça novamente. Foi-me roubado mês e meio atrás.

Bem, mesmo assim, ele vai estar lá daqui algumas horas. Depois do escurecer, se isso não incomodar você.

Bem.. Peter começou.

Esteja lá, o outro aconselhou. Ele deu a partida na moto. Nós não esperaremos. E partiu.

Segurando o braço esquerdo dolorido, Peter voltou para bicicleta. Após a luta com aqueles brutos, a missão pode não ser o melhor lugar para ele para passar a noite. Pois afinal, eles poderiam voltar querendo vingança. Seu estômago roncava por não ter sido alimentado desde o café da manhã, mas seria melhor permanecer vivo do que tentar um rango gratuito aqui e, mais tarde, ser assassinado em seu sono.

Pedalou mais para leste ao longo da Avenida Missão San Fernando e finalmente chegou à passarela que Kudjo Wilson havia mencionado. O sol tinha acabado de sumir e o céu estava ficando sinistramente escuro. Peter parou embaixo da passarela e olhou para cima. Deveria acreditar no que o negro tinha dito? Ele tinha há muito desistido de acreditar nos contos de fadas, e toda essa estória soava como um El Dorado moderno. Um lugar de paz e fartura seria muito difícil de encontrar, e convites para ele não cairiam no seu colo assim tão casualmente. Além disso, como poderia um homem negro ter a chave para Utopia? Não fazia sentido. Se houvesse tal lugar, o que Kudjo Wilson estava fazendo aqui?

Mas enfim, o que é que ele tem a perder? Se isto fosse uma emboscada, o que mais eles poderiam tomar dele além de sua bicicleta, um cobertor e algum dinheiro praticamente inútil? Seria pouco saque para uma armadilha tão elaborada. Além disso, Wilson poderia ter lhe roubado sozinho se quisesse. Toda essa situação era muito intrigante.

Peter pedalou sua bicicleta na rampa e estacionou do lado da ponte.

Sentou lá no escuro, a espera. O tráfego na estrada era praticamente inexistente devido à falta de gasolinaapenas dois carros em mais de uma hora, e passaram por ele na pista rápida sem ao menos diminuir de velocidade. Seriam as pessoas que ele devia encontrar que haviam passado? O teriam visto? Se não fossem eles, será que viriam afinal? Perguntou-se. Tudo isto poderia ser uma piada elaborada e incompreensível.

Você é um tolo, ele disse a si mesmo com firmeza. Escutando histórias da Terra do Nunca na sua idade. Você provavelmente compraria a ponte Golden Gate se alguém oferecesse a você agora. Mas ele ficou, porque não havia nenhum lugar para ir.

Depois do que deve ter sido outra hora, viu alguns faróis se aproximando do norte. Estes viajam mais lentamente do que os carros que passaram zumbindo, e, a medida que se aproximavam, Peter pode notar que era uma fila de carros em procissão. O veículo que encabeçava parou antes de chegar à ponte e saiu no acostamento. Os carros atrás seguiram o seu exemplo.

Um refletor ligou na parte superior do veículo e mirou em Peter, cegando-o com o seu brilho. Sr. Smith? chamou uma voz estranha.

Sim, ele respondeu.

Venha, entre, estávamos torcendo que estivesse aqui. Gostaria de jantar?

1 (NdT) Expressão pejorativa que designa alguém que abandonou seu lar depois do Colapso em busca de algo melhor. O termo será melhor explicado mais a frente.

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