O Coração Do Tempo - Amy Blankenship 2 стр.


As imagens e sons ficariam gravados para sempre em sua memória visual e Kyou, de alguma forma, sabia que ele nunca seria capaz de se livrar dos sentimentos que o invadiam. Porque compreendeu, quando penetrou na mente dela, que Kyoko tinha guardado sentimentos de amor por ele e pelos seus irmãos. Podia sentir cada toque e emoção acariciá-lo e cada lágrima oculta destruindo-o como se ele fosse ela.

Kyou também tinha a alma abalada pela pressa, pois compreendia que Kyoko tinha mais poder do que jamais pensara ter sem ao menos estar consciente disso. Podia ver e sentir cada lembrança que passava da mente dela para a de Hyakuhei como se fossem cravadas no seu coração para não serem nunca liberadas por ele.

Anos de amor, tristeza e sacrifício, tudo chegando num instante.

Lágrimas de tristeza escorriam pela face de Kyoko enquanto ela transmitia para a mente de Hyakuhei cada lembrança de amor, amizade, dor e sentimentos secretos que nutrira por todos com quem havia lutado. Era a única arma que lhe restava.

Instantaneamente, o demônio de Hyakuhei tinha se desequilibrado. Todos sentiram a troca de poder quando o cristal começou a cintilar entre o escuro e o branco ofuscante e as aparições sombrias que seguravam Toya e Kyou se desintegraram no ar.

Kyoko viu como o anjo da escuridão se confundiu, sua face pálida e perfeita ficando contorcida pela dor.

Logo que se viu livre, Kyoko esticou suas mãos pequeninas e agarrou o cristal arrancando-o da carne dele. Ela sabia o que tinha feito, porque já podia sentir sua mente livre da luta e com as lembranças que não queria perder. Lágrimas cristalinas desciam pela sua face, já marcada por prantos anteriores.

Ela tinha desistido de suas lembranças para poder salvá-las como um todo. Rapidamente, antes de perder a consciência, segurou o cristal do coração guardião contra seu próprio peito, do lado de seu coração.

Vendo Toya e Kyou saltarem para ficar ao seu lado, ela sussurrou: Lembrem-se de mim, e por favor, me encontrem.

A última coisa que Kyoko percebeu enquanto sua visão gradualmente se esvanecia, foi o grito de ambos chamando seu nome e tentando alcançá-la. Um com lágrimas douradas nos olhos e o outro, com lágrimas prateadas.

Kyou podia sentir Kyoko se esvanecendo e lhe ocorreu que ela morria. Ele ao saltou mesmo tempo de Toya, tentando desesperadamente alcançá-la quando tudo mudou, como uma gota d'água no olho. De Kyoko saíam ondas enquanto ela se esvanecia no ar. Kyakuhei soltou um grito de raiva e também se esvaneceu.

A mente de Kyou disparou quando o grito de seu irmão uniu-se ao seu e parou de repente, como se o som tivesse sido cortado num piscar de olhos. Ele soube, então, que Toya também havia se esvanecido. Kyou desceu suavemente no local vazio onde seu alvo tinha estado um segundo antes. Fuzilou com um olhar incrédulo e furioso os arredores. Todos tinham desaparecido.

Kyou sentiu a adrenalina percorrendo suas veias e misturando-se com seu nobre sangue de guardião. Havia visto e sentido tudo. Agora ele era dono de todas as memórias dela. Kyoko tinha dado tudo de si para salvá-los, e no último segundo ele tinha ouvido seu desejo. Provavelmente, ela nem sabia o que tinha feito, mas tinha levado todos consigo e o deixado para trás.

O feitiço que ele lançara em torno de si como proteção contra o cristal sagrado o impedira de acompanhar os outros. Com apenas algumas palavras murmuradas, ela tinha tirado tudo dele.

Seu corpo manteve-se altaneiro e orgulhoso. Sua longa cabeleira prateada flutuava em torno dele, e a seda branca de sua camisa tremulava com a brisa como se ele estivesse enfrentando uma tormenta invisível, igual a tempestade que trazia dentro do peito atormentado.

Sua aparência enquanto comtemplava o campo de batalha era a de um anjo majestoso, poderoso e perfeito. Mas houve um momento em que levou a mão ao rosto para afastar uma lágrima solitária que não pôde segurar.

Kyou flutuava num redemoinho de plumas douradas das asas que lhe haviam brotado, e o cercavam com grande esplendor dourado revelando sua identidade pela primeira vez de sua vida eterna.

O único ferimento que a batalha havia lhe causado era o corte que aparecia através do coração, um coração que ninguém sabia que ele possuía. Seu olhar deteve-se na estátua da jovem a poucos metros de distância e ele sussurrou, Kyoko, eu não te abandonei. A distância de mais de mil anos não basta para me impedir de te achar de novo!

Capítulo 2 O lado oposto

No outro lado do Coração do Tempo, dois anos depois, e mais de mil anos no futuro.

A carta estava endereçada para o santuário de Hogo. O avô Hogo olhou o envelope elegante que o mensageiro lhe entregava quando voltava para a mesa onde tomava chá. Antes da batida na porta, ele desfrutava a paz e quietude daquela casa, geralmente tão agitada.

Todos haviam saído para aproveitar a tarde. Tama estava num salão de jogos na cidade com uns amigos, Kyoko tinha ido à biblioteca para estudar, e a sra. Hogo fora fazer compras no mercado.

Apanhando uma pequena faca sobre a mesa, o avô deslizou cuidadosamente a lâmina afiada através do envelope de bordas douradas. Pegou uma carta com firma reconhecida em papel grosso de bordas douradas de dentro do envelope e começou a lê-la. Quanto mais lia mais atônito ficava. Tratava-se de uma bolsa de estudos, uma bolsa de estudos completa numa escola muito cara e em um subúrbio do outro lado da cidade.

Universidade K.L. Sua voz de ancião mostrou assombro, pela primeira vez em muitos anos. Enquanto lia, percebia que todos os custos estavam cobertos, até mesmo o custo do dormitório onde ela ficaria. A carta estava assinada pelo fundador da escola pela sua rubrica K.L.

O rosto enrugado do avô abriu-se no mais luminoso dos sorrisos. Kyoko iria ficar mais feliz do que nunca. Ele sabia que ela estava preocupada de não ser aceita em nenhuma academia por ter faltado tanto à escola, e agora, ela estava indo para uma melhor que qualquer outra da região.

Franziu o sobrolho, pensativo. A admissão nessa escola era a mais difícil de todas e ele não sabia de ninguém que tivesse tido a inscrição aceita. Havia também um boato que pouquíssimos estudantes eram aceitos por causa dos requisitos excessivamente rigorosos apenas para fazer a inscrição. Como ela tinha sido aceita num lugar para o qual nem tinha feito a inscrição?

Sua mente recapitulou os dois últimos anos. Kyoko tinha levado algum tempo para entrar de novo no clima do dia a dia depois tinha voltado da casa do santuário tão desorientada. Todos tinham ficado confusos quando ela aparecera repentinamente, pois ela não tinha lembrança alguma do tempo em que estivera ausente.

A família Hogo sabia onde ela havia estado, porque ela tinha ido e vindo através do portal do tempo muitas vezes. Kyoko era a única com amnésia súbita a respeito do ocorrido

Ela nem se lembrava de Toya. Mas para o avô tudo estava bem, pois ele achava melhor que ela não tivesse lembrança alguma do guardião da travessia do portal. Era melhor que ela esquecesse tudo sobre o outro lado e o perigo que tinha trazido.

Seus olhos ficaram tristes por um momento. Sim, a família sabia quase tudo que tinha acontecido, porque Kyoko ia e vinha entre os mundos e, enquanto neste lado, ela os colocava a par dos últimos acontecimentos. O avô também podia afirmar que ela escondera boa parte do que não queria que eles soubessem. Coisas que agora eles jamais saberiam, pois ela tinha esquecido esses segredos.

Mesmo depois de Tama, sua irmã mais nova, ter lhe contado muito do que sabia, ela apenas balançava a cabeça e abaixava os olhos. Apenas se lembrava de ter estado sozinha em outro mundo. Um mundo cheio de monstros.

Mesmo depois de Tama, sua irmã mais nova, ter lhe contado muito do que sabia, ela apenas balançava a cabeça e abaixava os olhos. Apenas se lembrava de ter estado sozinha em outro mundo. Um mundo cheio de monstros.

O avô franziu os lábios enquanto refletia. Ele sabia que as coisas tinham se endireitado porque Kyoko dissera que se lembrava de algo sobre o Cristal do Coração Guardião voltando para dentro dela e que isso não ocorria mais. Depois de algumas semanas, ela já se dedicava inteiramente aos trabalhos escolares e estava tirando ótimas notas; então, tudo tinha valido a pena. O avô ouviu a porta da frente se abrindo e sorriu abertamente.

Beijando a carta como se fosse um amuleto sagrado de boa sorte, viu sua neta indo para a cozinha. Kyoko adoraria essas notícias.

*****

Três semanas depois...

Olhos amarelos demoníacos observavam a jovem do passado se aproximar da academia. Ele a encontrara e, de alguma maneira, faria o que era certo novamente. Sentiu sua aparência humana se desvanecer por um instante, quando seus olhos brilharam como ouro líquido na lembrança de tudo que tinha acontecido naquele dia fatídico no meio da batalha cruenta.

Os raios do sol da manhã entraram pela janela projetando uma estranha sombra de asas atrás dele. Ergueu as mãos com garras e estreitou os olhos observando suas garras recuarem para o interior de seu disfarce humano.

Voltando seu olhar de assombração para a sacerdotisa, ele acalmou internamente seus poderes. Era chegado o momento. Com a pureza de Kyoko, sentiu o despertar da maldade dentro de si. A batalha inacabada estava prestes a começar. Dessa vez, ele não cometeria o mesmo erro.

Kyoko olhou o imenso edifício. Teve a mesma impressão de estar olhando o grande castelo de algum passado desconhecido. Sorriu intimamente; não pôde evitá-lo. Ela ainda estava muito feliz depois que soube da bolsa de estudos e pelo fato de que podia mesmo morar ali.

Voltou-se para Tama. Ele fôra de grande ajuda tendo vindo em seu auxílio, carregando sua bagagem e ajudando-a a se instalar. Kyoko estava contente por ter falado com sua mãe e avô quando estava em casa e ter podido se despedir deles. Estava meio tonta com tanta liberdade e respirou fundo para saboreá-la.

Kyoko, você vai ficar aí o dia inteiro, ou vai em frente procurar o dormitório? Tama se queixou, apesar de também ter ficado impressionado com a vista. Ele olhou para cima, pasmado com o gigantesco arco que levava ao portão principal.

Kyoko olhou o mapa e apontou para o enorme edifício ligado ao lado direito da escola. Deve ser aquele edifício. Ela virou-se para Tama dando uma piscadela. Obrigada pela ajuda hoje de manhã.

Tama sorriu, um pouco embaraçado. Claro Kyoko, afinal, vou ficar um pouco livre de você e só isso já me compensa. Partiu agachado tentando escapar dela morrendo de rir.

Kyoko começou a correr atrás dele, mas parou no meio do caminho sentindo-se observada.

Enquanto a brisa afastava seu cabelo ruivo-castanho do rosto, ela olhava o edifício perguntando-se que olhos eram esses que a espreitavam, já que não via ninguém. Vinha percebendo coisas estranhas nos últimos anos, e sabia que, sem dúvida alguma, alguém a espionava de perto. Quase sentia que a tocavam.

Pensou ter percebido algum movimento na janela de cima, mas ao fixar o olhar, não viu nada. Kyoko soltou um suspiro e compreendeu que a sensação de estranheza tinha passado. Suavemente mordeu o lábio sentindo-se decepcionada em partir. Desistindo por fim, ela finalmente alcançou Tama e entraram juntos no prédio. Ambos ficaram paralisados quando olharam em volta.

Esse lugar é assombroso, murmurou Tama, olhando e acrescentado com voz séria. Cuidado com esse mapa, conhecendo-a bem, digo que você pode se perder aqui.

Kyoko fingiu que não ouviu enquanto seus olhos vagavam pelo interior do saguão principal. O salão onde estavam tinha uma altura de três andares e uma escadaria que subia em espiral para os outros pisos. Num dos lados havia uma enorme biblioteca; o outro lado parecia abrigar uma área de recreação e, bem no meio, existia um gigantesco candelabro pendendo lá do alto do teto abobadado.

´Realmente, detestaria vê-lo cair´, disse ela para si mesma.

Embaixo do candelabro, uma área de estar com móveis luxuosos. Os estudantes estavam já ativos e empenhados em seus afazeres, embora ainda fosse bem cedo da manhã. Ela quis chegar o mais cedo possível e agora eram 7h30; olhou o mapa novamente perguntando-se para onde deveria ir em seguida.

Suspirando, olhou por cima do ombro para Tama e apontou a escada em espiral em frente deles. Tinham quatro maletas entre eles, pois Kyoko estava mesmo de mudança e elas estavam pesadas.

Tama fez cara desanimada. Você deve estar brincando. Ele soltou a alça da maleta maior reconhecendo que os rodízios não serviriam para nada dessa vez. Só tenho 12 anos, sabia?

Ela ergueu os ombros determinada.

Kyoko se surpreendeu quando uma voz masculina atrás dela disse: A senhorita chama-se Kyoko Hogo?

Ela imediatamente virou-se e respondeu: Sim

Seus olhos se arregalaram quando encarou o belo jovem que perguntava. Tinha surpreendentes olhos azuis e uma longa cabeleira escura puxada para trás em rabo de cavalo. Enquanto olhava admirada, sentiu uma brisa estranha passar pelo seu rosto. As pontas de seu cabelo lhe fizeram cócegas na face enquanto a brisa soprava.

Ele estava lhe sorrindo de maneira atraente. Então, para sua surpresa, ele estalou os dedos e dois camaradas apareceram não se sabe de onde, pegaram a bagagem e subiram a escada com elas. Os olhos de Kyoko mostravam assombro, mas antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, o outro sujeito levou suas mãos ao lábio e beijou-as como se ela fosse uma princesa.

Meu nome é Kotaro. Não gostaria de ver alguém tão linda como você tendo que carregar algo tão pesado. Agora, siga-me para que eu lhe mostre seu dormitório. Kotaro começou a subir as escadas confiantemente, de mãos dadas com ela.

O calor repentino que percorreu seus dedos e subiu pelos braços, continuou se espalhando pelo corpo de Kotaro e despertando seu sangue de guardião. Esse era um segredo que pretendia guardar. Kotaro apertou a mão dela ligeiramente sabendo que ela era quem esperara tão pacientemente. Sentira no momento em que ela entrara na sala.

Kyoko ergueu a sobrancelha delicadamente e pensou consigo mesma: Deuses, salvem-me de homens corteses.Onde é que vim parar?

Virando-se, ela encolheu os ombros para Tama, que estava ali de boca aberta. Kyoko levantou a cabeça para o lado e ergueu uma sobrancelha. Tama, tenha cuidado, você vai acabar pegando uma mosca se ficar assim. Antes que ele pudesse se recompor, ela virou-se e seguiu a figura ágil do sujeito que ela só sabia chamar-se Kotaro.

Mentalmente, ela marcou um ponto a seu favor, no marcador secreto e imaginário que mantinha entre ela e Tama. Ela o ouviu bufar atrás dela enquanto subiam as escadas e soube que estava ganhando o jogo.

Cruzaram então com um sujeito que descia as escadas. Quando ele passou sem olhá-la ela sentiu um aperto no coração e parou de respirar. O silêncio se fez quando ele passou por ela quase que em câmera lenta. Então, tudo voltou ao normal enquanto seu coração bateu uma vez menos e depois se acelerou.

Uma sensação de desconforto percorreu sua pele, como se ela não estivesse notando algo, ou melhor, como se ela tivesse perdido alguma coisa e sentisse muitíssimo. Tentando espantar a reação estranha, nem mesmo se voltou para descobrir quem tinha passado por ela. No momento sentiu que era melhor não tomar conhecimento.

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