As primeiras horas sem Becky Ann foram ok, mas acontece que no dia do seu aniversário, Serena acabou zanzando por aí sozinha, sem falar com ninguém. Verdade seja dita, isso a salvou dos esforços da amiga de lhe arranjar alguém, a maioria dos homens ali estavam com suas esposas e filhos, de qualquer forma. Mal podia esperar para voltar para casa, sério. Fariam uma última parada nas Bermudas e então voltariam para as Bahamas.
Ela foi caminhando em direção às cabines do navio e uma multidão apressada chamou a sua atenção.
É o Jack Sparrow! alguém gritou animado.
Não, dã. Ele é louro. Isso foi dito como se fosse um sacrilégio colocar os dois na mesma frase. Que Deus não permita.
Parando na base da curta escadaria que conduzia aos quartos, Serena olhou rapidamente para trás, na direção da gritaria, bem na hora que uma pequena horda de mulheres e crianças passavam em uma animada troca de murmúrios.
Mas eu quero tirar uma foto com ele a mulher disparou. Você já tirou uma.
Você é um rato imundo e desprezível? um garotinho perguntou com a voz maravilhada.
Você diz coisas como faça o navio em pedaços?
Uma mulher murmurou Eu o faria em pedaços.
Por que você não vai procurar a sua irmã, Tommy? E deixa a mamãe falar com o pirata bonzinho?
Você é um pirata de verdade? Posso segurar a sua espada?
Oh, meu Deus, Lisa, olha o traseiro dele. Ele é genuíno e sexy. O cruzeiro investiu mesmo neste ator.
Retrocedendo até chegar perto da multidão, Serena tinha que ver este pirata misterioso que estava atiçando hormônios e imaginações. Era seu aniversário, afinal. Ela não merecia dar uma boa olhada?
O bando de mulheres e crianças curiosas tinha feito um círculo em volta do ator vestido como, é um pirata. Espada, pistola, botas gastas na altura do joelho, casaco longo e marrom com botões dourados que brilhavam sob a luz. O pelo facial que crescia no rosto dele não era bem uma barba, mas não estava muito longe de ser. O cabelo louro era longo e parecia ondulado por causa da água do oceano e do vento. Anéis cobriam os seus dedos e quando ele virou a cabeça, a pequena argola que adornava a orelha brilhou à luz.
Tá de sacanagem.
Mas que clichê. Tudo o que faltava era um ventilador em algum lugar soprando o cabelo e o casaco enquanto ele tirava fotos estilo capa de romance com as suas ávidas admiradoras. Ele era lindo, ela tinha conseguido um vislumbre dele, mas nem morta se aproximaria daquela horda, não se pudesse evitar.
Estava quase se afastando mais uma vez quando notou que o pirata não estava sorrindo. Em vez disso, ele estava acuado perto da parede, como se estivesse prestes a colocar sua espada meio-que-realista-demais entre os dentes e escalar o casco do navio. Talvez ele não tivesse sido avisando de que não teria apenas crianças obcecadas com piratas, mas mulheres salivando pelo romantismo difundido pela cultura pop também.
Afff. Piratas românticos. Ela revirou os olhos. Faça-me um favor. Eles eram canalhas maliciosos e sujos cheios de dentes podres e sem nenhuma moral. Óbvio, Hollywood fazia com que fossem atraentes, mas piratas de verdade não eram sexys. Não eram modelos cheios de lápis de olho e com roupa de couro igual àquele cara da série Once Upon a Time. Eles eram criminosos. Mesmo quando encaixados nas áreas nebulosas, crimes ainda eram crimes no final das contas.
Ainda assim, Serena não conseguiu não se simpatizar com o cara enquanto ele olhava, com cautela, para a multidão. Pois bem, pirata. Ela deu de ombros. Multidões eram uó. Pessoas demais pairando com seus olhares curiosos e julgadores Não. Simplesmente não. Preferia saltar numa piscina de ácido. Infelizmente, por ser adulta, não conseguiria escapar das responsabilidades com facilidade. Principalmente porque precisava pagar as contas. O trabalho maçante no arquivo do enorme escritório de advocacia era perfeito para ela. Ela tinha a própria sala, não precisava ver os clientes e podia evitar pessoas durante a maior parte do dia.
Também era o trabalho mais chato da face da terra, por isso os amigos lhe deram um cruzeiro como presente de aniversário. Uma aventura muito necessária, eles disseram.
Serena bufou quando uma mulher se atirou no cara, agarrando-se a ele com força. Os olhos do pirata se arregalaram e ele baixou lentamente os olhos para a mulher agarrada a ele como uma estrela-do-mar e pigarreou. Ele embainhou a espada meticulosamente e tentou afastá-la. Era óbvio que ele não tinha bancado o pirata antes. Talvez fosse a estreia dele, o que era estranho considerando que o cruzeiro estava chegando ao fim. Naquele momento, ele parecia quase uma alma irmã; uma vítima de uma multidão que não queria deixá-lo em paz.
Os poucos amigos que tinha a ajudavam quando as pessoas, em geral, sobrecarregavam-na. Talvez fosse o que ela devesse fazer no seu aniversário: devolver o favor. Respirando fundo, Serena se preparou para o inevitável horror de falar com pessoas que não conhecia. O carma pela boa ação deveria dar uma guinada na sua sorte, era o mínimo a se esperar.
Ok, pessoal, ok. Abram caminho. O capitão, é, Morgan voltará amanhã. Ele precisa ir alimentar o papagaio. Serena pegou o pirata pelo braço e o puxou apesar das reclamações da multidão de que não havia um papagaio de verdade. O couro grosso do casaco dele era macio ao toque, o braço ali embaixo era quente e forte. Ela tremeu, e não foi de frio. Muito pelo contrário. Ele não se mexeu, e o calor subiu pelo pescoço e pelo rosto dela. Esperava que não tivesse feito algo que acabaria em humilhação. Odiava passar vergonha em público. Não lidava muito bem com essas ocasiões, o que divertia muito os seus amigos.
Em vez disso, ele encarou a sua mão e então foi subindo lentamente o olhar, viajando do braço até o seu rosto. O contato visual a atingiu como uma bala de canhão, um golpe certeiro que destruiu a sua decisão e a deixou nua enquanto o mundo ao redor deles se estilhaçava nas profundezas da sua percepção. Como se tivesse experimentado o mesmo que ela, os lábios dele se entreabriram. Então um sorriso presunçoso ergueu um dos cantos da boca do cara e ela engoliu em seco enquanto a realidade dura e fria voltava com toda intensidade. Não havia dúvida de que ele tinha a aparência de um malandro temerário, e Serena temia que não fosse tão imune àquilo quanto desejava.
Oh, meu Deus. Aquele olhar disse uma mulher do meio da multidão, quebrando o que restava do que quer que fosse aquele feitiço que amarrou Serena e o pirata por um instante. Ali está. Saqueie-me, pirata! Saqueie-me com força! Risadinhas e arquejos escandalizados da multidão fizeram Serena sair da inércia enquanto um garotinho perguntava em voz alto o que significava saquear, e muitas risadas sem graça foram ouvidas.
Certo adicionou Serena quando o homem não colaborou. O coração batia com força no peito, e a respiração ficou mais rápida por causa do pânico causado pela atenção dele e das pessoas que tinha sido focada nela. Você pode vir comigo ou ficar com eles. A escolha é sua. Precisava escapar dali antes que começasse a hiperventilar. Estava se fazendo de boba. Ele não precisava da sua ajuda, e ela tinha presumido algo que não deveria.
O pirata olhou para as mulheres e para as crianças com desdém, só pareceu lembrar da presença deles quando se virou para ver o que a fizera parar de olhar para ele, o que criou ainda mais tumulto. Ele se inclinou para pegar uma sacola velha e suja e a jogou sobre o ombro antes de fazer sinal para que Serena fosse na frente. Ela se virou, seguindo para o corredor de onde tinha vindo sem sequer esperar para ver se ele a seguia.
O pirata olhou para as mulheres e para as crianças com desdém, só pareceu lembrar da presença deles quando se virou para ver o que a fizera parar de olhar para ele, o que criou ainda mais tumulto. Ele se inclinou para pegar uma sacola velha e suja e a jogou sobre o ombro antes de fazer sinal para que Serena fosse na frente. Ela se virou, seguindo para o corredor de onde tinha vindo sem sequer esperar para ver se ele a seguia.
Podia ouvir a multidão às suas costas começar a se dispersar, e assim que eles viraram no corredor, sozinhos, o capitão Morgan a fez parar. Ele a pegou pela mão e levou as juntas dos seus dedos aos lábios, beijando-as levemente.
Preciso lhe agradecer, amor, pelo audacioso resgate.
Sentiu um frio na barriga que a fez tremer. Ele tinha um sotaque inglês que era influenciado pelas inflexões das ilhas caribenhas. Uma cacofonia de dialetos dentro de um único e delicioso timbre de voz masculina. Ótimo. Agora eu sou uma das adoradoras do pirata.
A seu dispor. Ela puxou a mão da dele e brincou, desconfortável, com uma mecha de cabelo. Olha, você precisa melhorar sua lengalenga para amanhã, ou eles vão te comer vivo.
O capitão Morgan franziu o cenho.
O que diabos é esse lugar? Um navio gigantesco cheio de canibais?
O quê? Ele só poderia estar brincando, mas a expressão horrorizada dele logo a fez adicionar Oh, não. Não. Eu não quis dizer que eles o comeriam vivo literalmente falando. Eu quis dizer figurativamente, como em uma figura de linguagem. Serena esperou que ele risse, que batesse no ombro dela de brincadeira e dissesse sacanagem. Mas ele não fez isso. Maldição. Ele estava realmente imerso no personagem agora que não estava sendo assediado. Deve ter sido medo de palco.
O pirata percorreu o seu corpo com os olhos aquecidos, observando as coxas nuas por baixo do seu short jeans e se demorou no lugar onde a blusinha floral deixava à mostra um pedaço de barriga. Ele lambeu os lábios, e Serena teve que afastar o olhar e respirar fundo. Por que não estava vestido calça e casaco? Que se danasse a temperatura de 35ºC.
O corredor era estreito, e o homem tomava a maior parte do espaço. O quarto dela era perto da proa do convés superior, e a vontade de fugir começou a ter certo apelo. Um homem nunca a olhara com tanta fome antes, e ela não sabia como agir como se não tivesse notado. Com certeza não iria encorajá-lo e fazer com que ele esperasse por algo que ela não estava disposta a dar. Bem, estar disposta não era bem a questão. Na verdade, a questão era a ação. O que a deixava com nenhuma outra opção que não fosse recuar. Era mais seguro. Nada de passar vergonha ou de ter conversas embaraçosas.
Conhecer pessoas novas sempre foi difícil para ela, especialmente quando essas pessoas eram homens. Todas as coisas engraçadas que ela diria em uma conversa normal não aconteceriam até que ela repassasse toda a conversa em sua mente mais tarde. Assim que as conhecia por mais tempo, as coisas ficavam mais fáceis, mas ela era péssima em flertar e sequer podia fazer contato visual por muito tempo, a menos que estivesse louca da vida. A raiva lhe dava mais coragem do que normalmente possuía. Uma bênção e uma maldição, a depender da circunstância.
Rapariga disse o capitão Morgan, dando um olhar corajoso e persistente demais para o seu peito , eu morri e fui para um veleiro de devassidão como recompensa? Essa é a vida após a morte?
Serena cuspiu marimbondo. Ele está usando falas de pirata? Sério? Além do mais, ele estava dando mole para ela? De todos as respostas em que pôde pensar, o melhor que veio a sua mente foi:
Você me chamou de rapariga? Quando ele se limitou a piscar como resposta, ela suspirou, fazendo o possível com o que tinha, por pior que fosse. É claro que chamou. Movimentando a mão para fazer xô para ele, ela adicionou Vá fazer suas devassidões em outro lugar. Eu estou indo para a cama. Tente se resolver antes de voltar lá para aquela multidão. Boa noite.
Ela deu as costas para ele e deu no pé, talvez um pouco rápido demais. Becky Ann ficaria de cara com o que ela fez. Quando Serena dissesse a ela que o ator pirata meio que deu em cima dela e ela fugiu intocada, a amiga lhe daria um sacode. Ela sabia que Serena era um horror na arte da pegação, mas ela não a teria deixado fugir como uma corça assustada.
Na verdade, provavelmente foi um presente do céu Becky Ann ter ficado doente porque ela os teria trancado no armário de limpeza até se convencer de que eles tinham feito vários dribles e marcado ao menos um gol. A melhor amiga era extremamente à vontade com a sexualidade. E no que dizia respeito ao seu método de formar casais, era à vontade demais. Era exaustivo se esquivar das ideias da amiga sobre diversão quando ela, com um drinque na mão e um sorriso maligno nos lábios, mandava Serena passear.
Enquanto enfiava a mão no bolso procurando pelo cartão, ela olhou para trás e soltou um gritinho. O capitão Morgan a seguira e esperava a alguns metros de distância com um brilho quase que ansioso nos olhos. Ele ergueu uma sobrancelha dourada e cruzou os braços quando ela não conseguiu destrancar a porta.
Abra a porta da cabine, rapariga. Estou cansado, mas tenho estamina o bastante para cuidar de você primeiro.
O significado das palavras dele foi como um soco no estômago, liberando todo o frio que estava lá dentro. Tudo aquilo fez as suas partes entrarem em alerta máximo: preparando, esperando, ansiando. Ah, merda. Ela fodeu com tudo.
Mas que diabos? aquilo era ela, fodendo com as coisas. Você não vai entrar. Esse é o meu quarto. Vá procurar o seu. Ele estava sendo assustador, não estava? Então por que a respiração dela ficou profunda, quase como se ela estivesse pensando em permitir que ele entrasse no quarto?
Aquilo jamais aconteceria. Não poderia seduzir um homem nem se tentasse. Faltava confiança, ela se sentiria boba e muito, muito ansiosa.
O pirata balançou a cabeça.
Eu vou ficar com você até aportarmos. Talvez você possa resolver o mistério desse navio. Ele fez um gesto abrangendo o ambiente.
Aquilo era de verdade?
Hum, que tal não. Mistério? Que mistério? Sua mente e o seu corpo a puxavam para direções opostas. Ao menos sua mente tinha bom senso, e estava dizendo para ela se fechar no quarto e trancar a porta. Esse homem é perigoso, mas não por ele ser um pirata falsificado. Estava atraída por ele, e ela não iria se envolver com ninguém naquele cruzeiro, não importa o que Becky Ann dissesse.
O pirata pareceu pensar naquilo, coçou a barba no queixo, mostrando os múltiplos anéis de prata que brilhavam à luz. Ambas as orelhas tinham argolinhas de ouro. Nunca tinha sido do tipo que tinha uma quedinha por homens com piercing, mas eles caíam bem nele.
Eu gosto da perseguição, amor. Posso esperar a noite toda. O sorriso espertalhão implicava que ele estava bem ciente de que ela o desejava. Uma pena, para ele, que aquilo não tinha a mínimo de importância.
Não estou brincando de nada. A voz dela tinha soado tão rouca para ele quanto soou aos seus ouvidos?
Ele invadiu o seu espaço pessoal, colocando a mão sobre a porta e enjaulando-a com o corpo. Serena prendeu a respiração e ele ergueu a outra mão para afastar o cabelo do seu rosto com carícias suaves. Ela tremeu quando ele murmurou:
Você está. As mãos dele eram grandes, calejadas e quentes. Como seria a sensação delas sobre o seu corpo nu?