Para exemplificar a utilidade dos dados de óbitos, empregando este criterio de classificação do C.I.E.10, nos centraremos em uma comunidade autônoma espanhola, especificamente em Andaluzia, cujo governo aposta no Open Data, e assim pode extrair dados sobre os óbitos nesta comunidade desde 1980, podendo observar a evolução dos dados acumulados até a atualidade sobre as causas dos óbitos por cada localidade independentemente de seu tamanho, ou seja, de cada cidade ou vila da dita comunidade autônoma.
Com base nos dados brutos, é possível observar como o número de óbitos associados a problemas de saúde mental evoluiu nos últimos 33 anos em Andaluzia, com um aumento significativo ocorrendo em Sevilha, Málaga e Cádiz, sendo o menor aumento em Huelva e Almeria. Mas se nos limitarmos a estes resultados, poderíamos chegar a falsas conclusões, porque não levamos em conta um importante fator de correção, o número de habitantes de cada localidade. Ou seja, não é o mesmo aparecer 10 casos em uma população de 100 habitantes, do que 10 em uma de 5.000 habitantes, para fazer os dados mais compreensíveis o mesmo quadro de comparação é normalmente estabelecido, por exemplo, a cada 100.000 habitantes, seguindo assim com os números anteriores, podemos chegar a taxas de 0,01 casos a cada 100.000, e de 0,05 casos a cada 100.000 habitantes respectivamente.
Tendo em conta o exposto acima, e seguindo com os dados históricos da comunidade autônoma de Andaluzia, para ajustar os resultados das causas de óbitos relacionados a saúde mental à população real do momento, foram extraídos os dados correspondentes aos números oficiais do Registro Municipal de Habitantes a partir de 1997 e as devidas correções foram feitas, de maneira que os resultados são totalmente diferentes dos observados anteriormente, sendo Córdoba, Granada e Jaén os que lideram a porcentagem de casos por habitantes, enquanto que as que menos têm casos são Málaga, Sevilha e Huelva.
É por isso que, assim como as delegacias de polícia, eles sabem em quais áreas um tipo de crime tem maior probabilidade de ocorrer do que outro devido a múltiplos fatores, como a população do local, as facilidades de acesso, número de estabelecimentos, da mesma forma, é possível saber em quais populações é mais provável se deparar com um problema relacionado à saúde mental do que com outra, mas de que adianta à um policial saber disso? Estamos falando de um número relevante de afetados? O Dr. Quazi Imam, Diretor Médico do Hospital Memorial de Arlington (EUA) comenta a respeito:
Quase 1 em cada 5 estadounidenses sofre de uma doença mental, portanto a cada ano, cerca de 42,5 milhões de estadounidenses adultos (18,2 por cento do total da população adulta nos Estados Unidos) sofrem de alguma doença mental, condições persistentes como a depressão, o transtorno bipolar ou a esquizofrenia. Em outros países, por exemplo, na Inglaterra estima-se que 1 em cada 4 adultos britânicos apresenta pelo menos um problema de saúde mental diagnosticável em um ano. Por sua vez, a Organização Mundial de Saúde publicou um número alarmante em 2014, estimando que aproximadamente 476 milhões de pessoas em todo o mundo têm um problema de saúde mental.
De todos os problemas de saúde mental, 300 milhões de pessoas sofrem de depressão (O.M.S., 2017), bem, isto não seria mais do que dados anedóticos, úteis para profissionais da saúde e, especificamente, da saúde mental, mas o que isso tem a ver com a polícia?
O trabalho policial em sua maior parte, senão todo, está intimamente relacionado à sua comunidade e aos problemas que ela tem, então há bairros onde existe uma taxa de criminalidade maior do que outros, mesmo aqueles em que a polícia não pode circular em segurança, precisando de reforços para entrar em determinadas áreas. Situação que permite em alguns casos e impede em outros, que exista uma relação fluída entre a polícia e seus vizinhos. Assim, se em uma determinada área houver mais um tipo de problema de saúde mental do que em outra, isso também será levado em consideração pela polícia, uma vez que as demandas de sua comunidade serão mais orientadas para o atendimento desses casos. Portanto, é comum que, se em um bairro existe um centro de atendimento para crianças com deficiência mental, às vezes é necessária a intervenção policial se alguma fugir de seu cuidador. Da mesma forma, se em uma área houver uma população particularmente idosa onde a porcentagem de pessoas com doenças neurodegenerativas é significativa, a polícia terá que intervir em mais de uma ocasião para ajudar um ou outro idoso quando este estiver perdido ou não souber como voltar para casa.
É para exemplificar como a ação policial, embora em muitos casos os agentes não estejam cientes disso, estará se adequando às necessidades de saúde mental da população onde atuam, mas em outras ocasiões é um trabalho consciente com pacientes. Embora, quando falamos em saúde mental, não esteja associado a problemas menores, podendo-se apresentar casos de agressividade e incluso violência, os quais a polícia também deve responder fazendo o que estiver ao seu alcance para manter a situação sob controle, mas como trabalhar com pessoas com problemas de saúde mental afeta aos policiais?
Isto é o que se tentou responder com uma pesquisa realizada pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, a Universidade do Porto em conjunto com o Hospital Magalhães Lemos (Portugal) e a Unidade de Psiquiatria Social e Comunitária (Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento de Serviços de Saúde Mental), Universidade Queen Mary de Londres (Inglaterra) (Soares & Da Costa, 2019). No estudo participaram dez agentes, com uma idade média de 46 anos e 22 de serviço, dos quais havia apenas uma mulher. A função destes profissionais consistia em transferir os pacientes para o hospital psiquiátrico, quando internações compulsórias eram necessárias.
A informação foi recolhida a partir das entrevistas realizadas com os agentes, as quais foram codificadas e analisadas, em cinco temas, Atividade policial e a internação compulsória, O papel da família no processo de internação compulsória, O sucesso da internação compulsória, As opiniões acerca das doenças mentais e Melhorias que proporiam em seu trabalho de internações compulsórias. Segundo os relatos dos agentes, para eles este foi o trabalho mais estressante e difícil que tiveram que realizar na força policial, destacando o papel mediador das famílias para facilitar seu trabalho de internação compulsória. Com relação à percepção dos pacientes de saúde mental, estes eram considerados imprevisíveis e perigosos, sentindo que eles como agentes não estavam preparados para lidar com este tipo de caso e entendiam que profissionais qualificados deveriam estar presentes neste trabalho. Pesquisa que apenas reflete a boa vontade dos agentes, mas que em ocasiões não é suficiente para lidar com determinado problema, principalmente nos casos mais graves de saúde mental. Portanto, a saúde mental da população será em muitos casos uma adição ao estresse gerado no trabalho policial, e isso sem levar em consideração que o próprio agente pode estar sofrendo algum problema nesta área, seja um transtorno de depressão, ansiedade ou outro.
A conduta de risco
Deve-se ressaltar que nem todos os óbitos que parecem ser suicídio serão, já que existem os acidentes, por exemplo, as pessoas que manuseiam armas, podem sofrer um acidente com elas, e igualmente realizar uma conduta arriscada que pode levar que um acidente pareça suicídio, que é mais frequente entre os adolescentes, porque quando se pensa em condutas de risco, geralmente se pensa nos comportamentos mais extremos, como dirigir em alta velocidade, ou praticar Bungee Jumping, mas igualmente arriscados para a saúde são os menos evidentes, como o consumo excessivo de tabaco, álcool ou outras drogas, mas será que os comportamentos de risco podem ser evitados?
Deve-se ressaltar que nem todos os óbitos que parecem ser suicídio serão, já que existem os acidentes, por exemplo, as pessoas que manuseiam armas, podem sofrer um acidente com elas, e igualmente realizar uma conduta arriscada que pode levar que um acidente pareça suicídio, que é mais frequente entre os adolescentes, porque quando se pensa em condutas de risco, geralmente se pensa nos comportamentos mais extremos, como dirigir em alta velocidade, ou praticar Bungee Jumping, mas igualmente arriscados para a saúde são os menos evidentes, como o consumo excessivo de tabaco, álcool ou outras drogas, mas será que os comportamentos de risco podem ser evitados?
Isto é precisamente o que foi investigado na Universidade de Oviedo (Espanha) (Lana, Baizán, Faya-Ornia, & López, 2015), com um estudo no qual participaram 275 estudantes de graduação em enfermagem, todos eles foram avaliados quanto ao seu nível de Inteligência Emocional utilizando a Escala de Inteligência Emocional padronizada por Schutte (Salovey & Mayer, 1990), e a conduta de risco, esta entendida como o consumo de tabaco, álcool, drogas ilegais, assim como a realização de dietas pouco sudáveis, se apresentavam ou não excesso de peso, se eram sedentários ou não, seu grau de exposição ao sol, e a prática de relações sexuais sem proteção, além de coletar dados sociodemográficos e de satisfação com a vida.
Os resultados mostram que aqueles estudantes que mostraram níveis elevados de Inteligência Emocional têm menos condutas de consumo excessivo de álcool, não seguindo dietas pouco saudáveis e mantendo relações sexuais sem proteção; e, ao contrário, os que mostravam níveis mais baixos de Inteligência Emocional tinham condutas de risco em termos de maior consumo de álcool, seguindo dietas pouco saudáveis e mantendo relações sexuais sem proteção. Não foram obtidas diferenças significativas nas condutas de risco de consumo de tabaco ou drogas ilegais, excesso de peso, sedentarismo ou grau de exposição solar em função do nível da Inteligência Emocional. Os autores apontam os benefícios de ter altos níveis de Inteligência Emocional quando se trata de gerenciar adequadamente a pressão do grupo, principal elemento em condutas como o consumo de álcool. Os resultados parecem claros quanto à conveniência de educar os mais novos para que tenham uma Inteligência Emocional desenvolvida, pois isso ajudará a prevenir futuras condutas de risco e evitar os acidentes que acarretam, às vezes que levam a situações que lembram suicídio; no caso da polícia constatou-se que os agentes homens dos 26 aos 34 anos são os mais propensos a apresentar condutas de risco (Walterhouse, 2019).
Outra variável que pode ser analisada no que se refere ao pressuposto de condutas de risco é o gênero, portanto, tradicionalmente se considera que os homens tendem a correr mais riscos do que as mulheres, mas existem evidências científicas que sustentem isso?
Quando se pensa em meninos, eles geralmente são considerados mais dinâmicos em termos de atividades físicas e também de risco do que as meninas, tanto é que os meninos são os que estatísticamente mais sofrem acidentes domésticos, seja por entrar em lugares errados ou por tocar no que não devem, apresentando um maior número de condutas exploratórias, por outro lado, as meninas tendem a se envolver em atividades menos físicas e mais intelectuais, que envolvem leitura ou conversar com colegas e adultos, e portanto, têm menos risco de sofrer qualquer tipo de acidente doméstico ou de outro tipo. Tendência que parece manter-se na adolescência, onde os jovens apresentam um maior número de ações que colocam a sua vida em risco, seja para se exibir na frente das meninas ou para se destacar competindo com outros meninos. Por outro lado, as jovens tendem a se destacar em outras áreas, como as intelectuais, pelas roupas que vestem; ou em atividades recreativas, como dançar.
É justamente nesta fase da vida que há um maior número de condutas de risco, devido à falsa crença de que nada lhes vai acontecer e, por outro lado, é o momento em que ocorrem mais acidentes, sejam eles de trânsito, ou de outro tipo. Atitudes que ao longo do tempo vão relaxando, embora se mantenham ao longo da vida, basta ver como tradicionalmente existem profissões majoritariamente masculinas associadas a uma maior atividade física, ou a condutas de risco, seja no campo do esporte ou do entretenimento; por outro lado, as mulheres há muito ocupam uma porcentagem maior das salas de aula, obtendo melhores resultados acadêmicos em todos os níveis.
No caso dos órgãos e forças de segurança, apesar de cada dia mais mulheres ingressarem nessas corporações, ainda há uma grande diferença entre homens e mulheres, assim, na Espanha, no caso específico da Polícia Nacional em 2019, o número de mulheres representa 14,5% dos membros da corporação, ou seja, 9.063 mulheres de 62.953 agentes (El Plural, 2019), muito atrás de países como a Estônia com 33,9%, a Holanda com 28,9% ou a Suécia com 28,8% em 2012 (Instituto de Segurança Pública da Catalunha, 2013).
Quanto à origem e utilidade destas diferenças, foi identificado que se trata de um comportamento herdado de nossos ancestrais, onde o macho era quem deveria sair para caçar e enfrentar as dificuldades do mundo exterior, ao invés disso, a fêmea permaneceu dentro do território seguro onde havia menos perigo, o que lhe permitia desenvolver outras habilidades mais úteis para as funções que tinha. Essa contribuição vem sendo discutida, pois atualmente não existe uma distribuição tão marcada de papéis, como acontecia no passado, embora continuem ocorrendo, mas qual seria o motivo das diferenças na tomada de risco por gênero?
Para responder a esta pergunta, um estudo foi conduzido em conjunto pela Universidade de Ciências Eletrônicas e Tecnologia da China, o Hospital Geral Universitário Médico de Tianjin; e a Academia Chinesa de Ciências (China); juntamente com a Universidade de Adelaide e a Universidade de Queensland (Austrália) (Zhou et al., 2014), participaram do estudo 289 voluntários com idade média de 22 anos, aos quais foram administrados 15 testes psicotécnicos, além de estudar a atividade cerebral por meio de ressonância magnética funcional (fMRI). Os resultados relacionam os dados obtidos em todos os testes, encontrando diferenças significativas entre os participantes no córtex somatossensorial secundário direito, que incluía o córtex dorsal anterior bilateral, córtex insular médio e córtex cingulado anterior dorsal.
O estudo tenta, portanto, responder a um comportamento que até agora não tinha podido ser explicado, verificando como o comportamento diferencial entre homens e mulheres é sustentado por importantes diferenças cerebrais, que revelariam a maior tendência para assumir condutas de risco por parte dos homens.
Com base nesses resultados, era de se esperar que houvesse uma taxa maior de suicídio entre policiais homens e mais jovens, que também apresentariam condutas de risco, para verificar isso, os dados obtidos junto à Associação Reformista Policial são utilizados em seu Estudo e Análise Complementar do Plano de Prevenção ao Suicídio na Polícia Nacional, onde são coletadas estatísticas sobre a incidência de suicídios nesta corporação de 2000 a 2017 separados por idade (A.R.P., 2019) ver tabela I.
Idade de 24 a 29 de 30 a 35 de 36 a 41 de 42 a 47 de 48 a 53 de 54 a 59 de 60 a 65 Porcentagem 11,84 21,71 17,11 16,45 16,45 15,79 0,66Tabela I. Distribuição de suicídios em função de faixa etária na Polícia Nacional de 2000 a 2017