Um Trono para Irmãs - Морган Райс 2 стр.


“Não, ainda não estás a fazer bem. E eu sei que não és desajeitada, miúda. Eu já te vi a fazer a roda no pátio.”

No entanto, ela não puniu Kate por isso, o que sugeria que a Irmã Yvaine não era uma das piores. Kate tentou novamente, com a mão a tremer.

Ela e as outras miúdas que estavam com ela deveriam estar a aprender a servir elegantemente em mesas nobres, mas a verdade era que Kate não tinha sido feita para isso. Ela era demasiado baixa e musculada para o tipo de feminilidade graciosa que as freiras tinham em mente. Havia uma razão pela qual ela mantinha curto o seu cabelo ruivo. No mundo ideal, onde ela era livre para escolher, ela ansiava por aprender com um ferreiro ou talvez com um dos grupos de atores que trabalhavam na cidade - ou talvez até ter a oportunidade de entrar no exército como os rapazes faziam. Este servir de água gracioso era o tipo de lição que a sua irmã mais velha, com o seu sonho de aristocracia, teria gostado - não ela.

Como se o pensamento a tivesse convocado, Kate, de repente, despertou ao ouvir a voz da irmã na sua mente. Ela questionou-se, porém; o talento delas nem sempre era assim tão confiável.

Mas então voltou a acontecer, e lá, também, estava a sensação por detrás disso.

Kate, o pátio! Ajuda-me!

Kate conseguia sentir que ela estava com medo.

Ela afastou-se da freira bruscamente, involuntariamente, e, ao fazê-lo, derramou a sua jarra de água na pedra do chão.

“Desculpa” disse ela. “Eu preciso de ir.”

A Irmã Yvaine ainda estava a olhar fixamente para a água.

“Kate, limpa isto imediatamente!”

Mas Kate já estava a correr. Ela provavelmente iria ser espancada por isso mais tarde, mas ela já tinha sido espancada antes. Isso não significava nada. Mas ajudar a única pessoa no mundo com quem ela se importava já significava.

Ela correu pelo orfanato. Ela conhecia o caminho, porque ela tinha aprendido todas as voltas deste lugar durante todos aqueles anos desde aquela noite horrível em que a deixaram aqui. Ela também, na noite tardia, escapulia-se do interminável ressonar e fedor do dormitório quando conseguia, desfrutando o lugar na escuridão quando ela era a única levantada, quando o toque dos sinos da cidade era o único som, e aprendendo a sensação de cada recanto nas suas paredes. Ela sentia que iria precisar disso um dia.

E agora ela precisava.

Kate conseguia ouvir o som da sua irmã, a lutar e a pedir ajuda. Por instinto, ela baixou-se e entrou para uma sala apanhando um atiçador da lareira e continuando. O que ela ia fazer com ele, ela não sabia.

Ela emergiu no pátio, e ficou destroçada ao ver a sua irmã a ser imobilizada no chão por dois rapazes, enquanto outro remexia desajeitadamente no seu vestido.

Kate sabia exatamente o que fazer.

Uma raiva primitiva apoderou-se de si, uma que ela não conseguia controlar se quisesse, e Kate correu para a frente com um rugido, dando balanço ao atiçador para a cabeça do primeiro rapaz. Ele virou-se quando Kate atacou, pelo que o atiçador não o atingiu tão bem quanto ela queria, mas ainda foi o suficiente para atirá-lo ao chão, com ele a agarrar-se ao local que ela tinha atingido.

Ela atacou outro, apanhando-o pelo joelho enquanto ele estava de pé, fazendo-o cair. Ela atacou o terceiro no estômago, até ele ficar de joelhos.

Ela continuou a bater, não querendo dar aos rapazes nenhum tempo para recuperarem. Ela havia estado em muitas lutas nos seus anos no orfanato, e ela sabia que não podia confiar no tamanho ou na força. A fúria era a única coisa que a salvava. E, felizmente, disso, Kate tinha muita.

Ela atacou sem parar, até os rapazes retrocederem. Eles poderiam estar preparados para se juntar ao exército, mas os Irmãos Mascarados do lado deles não os ensinaram a lutar. Isso tê-los-ia tornado muito difíceis de controlar. Kate bateu no rosto de um dos rapazes, depois girou para trás atingindo o cotovelo de outro com um ferro que fez um estrondo no osso.

“Levanta-te” disse ela à sua irmã, estendendo-lhe a mão. “Levanta-te!”

A sua irmã levantou-se entorpecida, agarrando a mão de Kate como se ela fosse a irmã mais nova por uma vez.

Kate desatou a correr, e a sua irmã correu com ela. Sophia parecia voltar a si mesma enquanto elas corriam, e alguma da velha certeza parecia regressar à medida que elas corriam pelos corredores do orfanato.

Atrás delas, Kate conseguia ouvir gritos, de rapazes ou de irmãs ou de ambos. Ela não se importava. Ela sabia que só lhe restava fugir.

“Não podemos voltar” disse Sophia. “Nós temos de deixar o orfanato.”

Kate assentiu. Algo como isto não custaria apenas um espancamento como punição. Mas então Kate lembrou-se.

“Então vamos” respondeu Kate, correndo. “Primeiro eu só preciso de...”

“Não” disse Sophia. “Não há tempo. Deixa tudo. Precisamos de ir.”

Kate abanou a cabeça. Havia algumas coisas que ela não poderia deixar para trás.

Então, em vez disso, ela correu na direção do seu dormitório, segurando o braço de Sophia para que ela a seguisse.

O dormitório era um lugar sombrio, com camas que eram pouco mais do que ripas de madeira a saírem da parede como prateleiras. Kate não era estúpida ao ponto de colocar qualquer coisa que importasse na arca pequena aos pés da cama, onde qualquer pessoa conseguiria roubá-la. Em vez disso, ela dirigiu-se a uma fenda entre duas tábuas do chão, enfiando lá os dedos até uma levantar.

“Kate” resmungou e soprou Sophia, recuperando a sua respiração, “não há tempo.”

Kate abanou a cabeça.

“Eu não vou deixar isto aqui.”

Sophia tinha de saber o que é que ela tinha ido buscar; a única memória que ela tinha daquela noite, da antiga vida delas.

Finalmente, o dedo de Kate enrolou-se à volta de metal, e ela levantou o medalhão completamente para este ficar a brilhar sob a fraca luz.

Quando ela era criança, ela tinha a certeza de que era ouro verdadeiro; uma fortuna à espera de ser gasta. Ao crescer, ela viria a perceber que era uma liga mais barata, mas, de qualquer das formas, à época, para ela o medalhão valia muito mais do que ouro. A miniatura lá dentro, de uma mulher sorridente enquanto um homem tinha a mão no ombro dela era a coisa mais próxima de uma lembrança que ela tinha dos seus pais.

Kate normalmente não o usava por medo de que uma das outras crianças, ou as freiras, o tirassem de si. Agora, ela aconchegou-o dentro do vestido.

“Vamos” disse ela.

Elas correram para a porta do orfanato, supostamente sempre aberta, porque a Deusa Mascarada tinha encontrado portas que estavam fechadas para si quando ela visitou o mundo e tinha condenado aqueles que estavam lá dentro. Kate e Sophia correram pelas curvas e contracurvas dos corredores, saindo no pátio da entrada, olhando em redor à procura de perseguidores.

Kate conseguia ouvi-los, mas naquele momento, apenas estava junto à porta a irmã habitual: uma mulher gorda que se moveu para bloquear o caminho exatamente quando as duas se aproximaram. Kate ficou corada ao relembrar-se imediatamente de todos os anos de espancamentos que ela havia sofrido nas mãos dela.

“Aqui estão vocês” disse ela num tom severo. “Vocês foram ambas muito desobedientes e...”

Kate não fez uma pausa; ela atingiu-a no estômago com o atiçador, com força suficiente para ela se dobrar. Naquele momento, ela desejou que o atiçador fosse uma das espadas elegantes que usavam os cortesãos, ou talvez um machado. Mas assim, ela teve de se contentar por simplesmente atordoar a mulher o tempo suficiente para ela e Sophia passarem a correr.

Mas naquele momento, quando Kate atravessou as portas, ela parou.

“Kate!” gritou Sophia, com uma voz de pânico. “Vamos! O que é que estás a fazer?”

Mas Kate não conseguia controlá-lo. Mesmo com os gritos dos que as perseguiam intensamente. Mesmo sabendo que tal arriscava a liberdade de ambas.

Ela deu dois passos para a frente, ergueu o atiçador e bateu nas costas da freira sem parar.

A freira grunhia e chorava a cada golpe, e cada som era música para os ouvidos de Kate.

“Kate!” implorou Sophia, à beira das lágrimas.

Kate olhou para a freira por um longo tempo, demasiado tempo, precisando entranhar essa imagem de vingança, de justiça, na sua mente. Ela sabia que isso a iria fazer aguentar quaisquer espancamentos horríveis que se pudessem seguir.

Então ela virou-se e desatou a fugir com a sua irmã da Casa dos Não Reclamados, como duas fugitivas de um navio a afundar-se. O fedor, o ruído e a agitação da cidade atingiam Kate, mas desta vez ela não abrandou.

Ela segurava a mão da sua irmã e corria.

E corria.

E corria.

E, apesar de tudo aquilo, ela respirou profundamente e sorriu amplamente.

Por muito pouco que pudesse durar, elas tinham encontrado a liberdade.

CAPÍTULO DOIS

Sophia nunca tinha tido tanto medo, mas, ao mesmo tempo, nunca se tinha sentido tão viva, nem tão livre. Ao atravessar a cidade com a sua irmã, ela ouvia Kate a gritar de emoção, e isso tanto a deixava à vontade como a aterrorizava. Tal tornava isto muito real. A vida delas nunca mais seria a mesma.

“Não faças barulho” insistiu Sophia. “Vais fazer com que eles venham atrás de nós”.

“Eles vêm na mesma” respondeu a irmã. “Pelo que é melhor desfrutarmos.”

Como se para enfatizar o ponto, ela esquivou-se em torno de um cavalo, tirou uma maçã de uma carroça e correu pela calçada de Ashton.

A cidade estava movimentada com o mercado que ocorria a cada seis dias, e Sophia olhava em volta, maravilhada com todas as vistas, sons e cheiros. Se não fosse pelo mercado, ela não teria ideia de que dia era. Na Casa dos Não Reclamados, essas coisas não importavam, apenas os intermináveis ​​ciclos rotineiros de oração, trabalho, punição e aprendizagem.

Corre mais depressa, enviou a sua irmã.

O som de assobios e gritos algures atrás delas incitou-as a uma nova velocidade. Sophia foi à frente por um beco, e, depois, esforçou-se para seguir Kate que trepou por cima de uma parede. A sua irmã, com toda a sua impetuosidade, era muito rápida, como um músculo sólido e em tumulto à espera de brotar.

Sophia mal conseguia trepar enquanto soavam mais assobios. Quando ela se aproximou do topo, a mão forte de Kate estava à espera dela, como sempre. Mesmo nisto, ela apercebeu-se, elas eram tão diferentes: a mão de Kate era áspera, calosa, musculada, enquanto os dedos de Sophia eram longos, suaves e delicados.

Dois lados da mesma moeda, a mãe delas costumava dizer.

“Eles convocaram os vigias” gritou Kate com descrença, como se isso de alguma forma não fosse justo.

“O que é que estavas à espera?” respondeu Sophia. “Nós estamos a fugir antes de nos conseguirem vender.”

Kate liderou o caminho por estreitos degraus de calçada abaixo, e, depois, em direção a um espaço aberto repleto de pessoas. Sophia forçou-se a abrandar quando elas se aproximaram do mercado da cidade, segurando o antebraço de Kate para evitar que ela corresse.

Vamos misturar-nos mais se não estivermos a correr, Sophia enviou, com pouco fôlego para falar.

Kate não parecia tão certa, mas ainda assim ela acompanhou o ritmo de Sophia.

Elas caminharam lentamente, passando por pessoas que se afastavam, obviamente não querendo arriscar o contacto com alguém de origens tão humildes quanto elas. Talvez eles pensassem que as duas haviam sido libertadas para alguma incumbência.

Sophia forçava-se a parecer como se estivesse apenas a passear enquanto elas usavam a multidão para camuflagem. Ela olhou em volta, para a torre do relógio acima do templo da Deusa Mascarada, para as várias bancas e para as lojas com montras de vidro para lá delas. Havia um grupo de atores num canto da praça, representando um dos contos tradicionais em trajes elaborados, enquanto um dos censores assistia da borda da multidão circundante. Num contentor estava um recrutador para o exército, a tentar recrutar tropas para a mais recente guerra a apoderar-se desta cidade, uma batalha iminente no Canal da Faca-Água.

Sophia viu a sua irmã a olhar para o recrutador e puxou-a para trás.

Não, Sophia enviou. Isso não é para ti.

Kate estava prestes a responder quando, de repente, os gritos começaram novamente por detrás delas.

Ambas começaram a correr.

Sophia sabia que ninguém as iria ajudar agora. Era Ashton, o que significava que ela e Kate é que estavam mal ali. Ninguém iria tentar ajudar duas fugitivas.

Na verdade, quando ergueu os olhos, Sophia viu alguém começar a dirigir-se a elas, para as bloquear. Ninguém iria deixar duas órfãs escaparem das suas obrigações, do que elas eram.

Mãos tentavam agarrá-las, e agora elas tinham de lutar para conseguirem passar. Sophia deu uma palmada numa mão no seu ombro, enquanto Kate espetou violentamente com seu atiçador roubado.

Um espaço abriu-se em frente a elas e Sophia viu a sua irmã correr para uma seção de andaimes de madeira abandonados ao lado de um muro de pedra, onde os construtores deviam ter andado a tentar endireitar uma fachada.

Mais escalada? Sophia enviou.

Eles não nos vão seguir, ripostou a sua irmã.

O que provavelmente era verdade, só porque o grupo de pessoas comuns que as percorriam não iria arriscar a sua vida assim. Todavia, Sophia temia-o. No entanto, ela não conseguiu pensar em ideias melhores naquele momento.

As suas mãos que tremiam fecharam-se em torno das ripas de madeira dos andaimes, e ela começou a escalar.

Em questão de momentos, os seus braços começaram a doer-lhe, mas naquele momento ou continuava ou caía, e mesmo se não fosse pela calçada lá em baixo, Sophia não queria cair com a maioria da multidão a persegui-la.

Kate já estava à espera no topo, ainda a sorrir como se todo aquilo fosse algum jogo. A sua mão estava lá novamente, e ela puxou Sophia para cima. Seguidamente, elas estavam a correr novamente - desta vez nos telhados.

Kate ia à frente em direção a um fosso que levava a um outro telhado, saltando para o colmo como se ela não se importasse com o risco de continuar. Sophia seguia-a, mordendo o desejo de gritar quando quase escorregou, saltando com a sua irmã para cima de uma secção baixa, onde uma dúzia de chaminés deitavam fumo de um forno abaixo.

Kate tentou correr de novo, mas Sophia, sentindo uma oportunidade, agarrou-a e puxou-a para dentro do colmo, escondendo-se entre o amontoado.

Espera, ela enviou.

Para sua surpresa, Kate não discutiu. Ela tentava localizar-se enquanto elas tentavam comprimir-se para baixo na secção plana do telhado, ignorando o calor que vinha das chamas abaixo, e ela deve ter percebido o quão escondidas elas estavam. O fumo encobria praticamente tudo o que estava ao redor delas, colocando-as numa neblina, escondendo-as ainda mais. Era como uma segunda cidade aqui em cima, com linhas de roupas, bandeiras e galhardetes que forneciam toda a proteção que elas poderiam querer. Se ficassem quietas, ninguém as conseguiria ver aqui. Nem mais ninguém seria tolo o suficiente para arriscar caminhar no colmo.

Sophia olhou em redor. Era pacífico aqui à sua própria maneira. Havia lugares onde as casas estavam tão próximas que os vizinhos conseguiam tocar uns aos outros, e, mais adiante, Sophia viu um penico de quarto a ser esvaziado para a rua. Ela nunca tinha tido a oportunidade de ver a cidade deste ângulo, as torres do clero e os fabricantes de tiro, os guardiões do relógio e os sábios erguendo-se sobre o resto da cidade, o palácio localizado no seu próprio anel de muralhas como carbúnculo a brilhar sobre a pele do resto.

Ela ficou ali encolhida com a sua irmã, com os seus braços envoltos em torno de Kate, e esperou que os sons da perseguição passassem lá em baixo.

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