- Então você diria que há uma boa chance de que o anel encontrado na cena seja um dos que ela pegou de sua mãe.
- Provavelmente. Mas esse é o ponto... ela deixava-os no closet. Quem fez isso...
Ele parou, como se a simples menção ao que tinha sido feito com o anel lhe congelasse. Mark respirou fundo e balançou a cabeça, determinado a continuar.
- Quem fez isso - ele continuou, - deveria saber onde procurar o anel.
- Ou simplesmente a pessoa teve sorte e descobriu onde as joias caras ficavam.
- Verdade – Mark disse.
- E a semana antes da sexta-feira... aconteceu algo diferente com sua mulher?
- Não. Eu já pensei nisso... tentei lembrar de algo. Mas eu juro... ela parecia estar muito bem.
- Nós soubemos que Jessie tinha começado a se envolver com grupos e organizações locais – Rhodes disse. – Você sabe que grupos são esses?
- Ela falava muito sobre a ‘Parceiros das Crianças’, essa ONG que junta dinheiro para crianças que não conseguem pagar pelas refeições na escola, coisas assim. Tinha outra... um clube no jardim, algo assim. Tenho certeza que sei onde ela anotava os nomes e números dessas pessoas, se vocês quiserem ver.
- Nós já temos uma cópia disso – Nolan disse.
Mark assentiu, virando os olhos.
- Certo. Eu juro... nesses últimos três dias, tudo parece estar borrado na minha mente.
- Tenho certeza que sim – Chloe disse. – Senhor Fairchild, obrigado pelo seu tempo. Por favor... vá para casa e descanse. E eu peço que você fique na cidade pelos próximos dias, caso seja preciso fazer mais algumas perguntas.
- Claro.
Mark levantou-se e respirou fundo ao sair da sala com seu irmão. Nolan os seguiu, fechando a porta.
- O que você acha? – Rhodes perguntou a Chloe quando elas ficaram sozinhas.
- Acho que mesmo que Mark Fairchild tivesse algo para dizer que nos ajudasse, ele provavelmente não se lembraria. Mas acho que ele está falando a verdade sobre aquela manhã. Ele ficou vermelho quando falou em sexo. E as pausas que ele fez... estava mesmo lutando contra as lágrimas.
- Sim, eu também percebi isso.
- Mesmo assim, a história parece interessante, não? Um novo casal de ricos chega na cidade. O marido tem um trabalho que lhes mantém nas classes mais altas. E eles viram alvo de alguém imediatamente... menos de cinco semanas depois da mudança.
- Você acha que eles estavam fugindo de algo? – Rhodes perguntou. – Você acha que eles podem ter vindo para Falls Church para escapar de algo em Boston?
- Pode ser. Eu quero saber o máximo possível sobre o trabalho dele. Talvez investigar as informações financeiras do casal e os registros criminais dos dois. Talvez até falar com o patrão do Mark, se for preciso.
- Acho que nós precisamos checar a seguradora, também – Rhodes disse. – Acho estranho que nenhum alarme tenha disparado. Me faz pensar que Jessie Fairchild deixou o assassino entrar.
Enquanto as duas pensavam em tudo aquilo, a porta da sala voltou a se abrir e Nolan entrou novamente. Ele parecia estar se sentindo mal por ter dividido a sala com um homem tão destruído emocionalmente.
- Nolan, o que nós sabemos sobre o trabalho do senhor Fairchild? – Chloe perguntou.
- Ele é um corretor financeiro padrão. Pelo que ele me disse, teve sorte em alguns negócios no começo da carreira. Isso fez com que alguns clientes de alto nível ficassem muito felizes com ele. Ele é muito humilde quando fala disso, mas nos disse que ganhou um pouco mais de seis milhões no ano passado.
- E os números continuam crescendo?
- Pelo que sabemos, sim. Não checamos as finanças deles profundamente ainda, nem o imposto de renda do ano passado. Dissemos a ele que talvez isso fosse preciso. Ele pareceu um pouco ofendido, mas nos deu sua permissão. Nos deu até alguns contatos do trabalho dele, caso nós precisássemos de ajuda.
- Então, em outras palavras, ele não está escondendo nada quando o assunto é dinheiro.
- Isso mesmo. Totalmente limpo, pelo que podemos ver. Mas eu provavelmente ainda vou entrar em contato com os números que ele nos passou, só para ter certeza.
- Também não vi nenhum registro criminal nos arquivos – Rhodes acrescentou.
- É. Nenhum dos dois tem registros criminais. Nada. Nem uma multa de trânsito.
Chloe olhou para a pasta com os arquivos sobre a mesma, a sua frente, e franziu a testa. Sim, o caso parecia estar muito distante das mortes por estrangulamento de um ano antes. Mas ainda assim, havia uma morte sem solução.
Ela olhou para a pasta, como se o objeto pudesse lhe trazer respostas. Basicamente, Chloe já havia memorizado o que havia ali dentro: a história do assassinato de Jessie Fairchild em forma de relatórios, anotações e fotos do crime.
E até então, aquela história parecia longe do fim.
CAPÍTULO SETE
Chloe havia se esquecido de quão úteis podiam ser longos trechos de carro com alguém ao lado. Elas saíram de Falls Church às 8:42 e voltaram a Washington, mas fizeram bom uso dos quarenta minutos de estrada. Antes mesmo de saírem de Falls Church, Rhodes já havia conseguido falar com um gerente da Intel Security pelo telefone. A Intel era a marca do sistema de segurança da casa dos Fairchild. Chloe escutou a conversa enquanto dirigia, à noite, voltando para casa.
Ela sorriu algumas vezes, percebendo como Rhodes era boa em lidar com as pessoas. Chloe já havia percebido que Rhodes só fazia perguntas durante os interrogatórios quando tinha algo útil para perguntar. Ela não gostava muito de fazer centenas de perguntas, esperando que uma delas trouxesse uma boa resposta. Da mesma maneira, ela soube como fazer as perguntas certas com a equipe da Intel. Foi educada e cordial, mas precisa ao pedir o que precisava. Chloe, por sua vez, estava com dificuldades de compreender a conversa como um todo, já que estava ouvindo apenas o que Rhodes dizia.
Muitos minutos depois, quando a ligação foi encerrada, Rhodes a contou tudo. Nesse momento, Chloe percebeu mais uma das qualidades de Rhodes. Ela sabia muito bem como repassar informações, sem sequer precisar fazer anotações. A mente daquela mulher era um verdadeiro HD quando se tratava de guardar detalhes.
- Então, o senhor com quem eu falei disse que o alarme não disparou na sexta pela manhã – Rhodes disse. – Ele também pesquisou os dados deles e não encontrou registros do alarme sendo desativado em nenhum momento. O sistema não foi desligado pelos Fairchild.
- Ele deu detalhes de como o sistema funciona?
- Sim. O alarme toca quando a porta é aberta à força. Abrir com uma chave automaticamente silencia o alarme. Quando a porta é aberta por dentro, ele também não toca. O alarme só tocaria se alguém estivesse chutando a porta, ou se ela ficasse aberta por mais de vinte segundos.
- Nas semanas em que eles moraram ali, o alarme chegou a tocar alguma vez?
- Ele disse que tem dois registros na conta deles. Os dois da primeira semana em que eles estavam na casa. A Intel liga para os clientes quando o alarme dispara. Nas duas vezes, Mark Fairchild disse que eles não haviam fechado a porta completamente enquanto levavam as caixas e os móveis da mudança para dentro de casa.
- E as janelas? O alarme funciona nelas também?
- Pelo que o senhor me disse, sempre que uma janela for aberta por fora, o sistema precisa estar desativado. Eles me deram um exemplo de quando você vai limpar as janelas, por exemplo. Se alguém quer fazer esse tipo de limpeza, precisa desativar o alarme primeiro.
- Mas você disse que não houve chamadas suspeitas do alarme na última semana, certo?
- Nenhuma.
- Então, em outras palavras – Chloe disse, - quem matou Jessie Fairchild não entrou a força. Essa pessoa teve permissão para entrar.
- Parece que sim.
O carro ficou em silêncio enquanto as duas pensavam naquilo. Chloe sabia qual deveria ser sua próxima busca. Até então, tudo o que elas sabiam sobre Jessie Fairchild era que desde que se mudara com o marido, Mark, para Falls Church, ela estava tentando envolver-se em grupos e organizações locais. Novos na cidade, nem ela nem Mark tinham amigos de verdade—o que significava que a maioria das pessoas com quem eles conversavam não eram confiáveis.
Mas Chloe também pensou em uma pergunta que já havia aparecido antes. Será que os Fairchild teriam saído de Boston fugindo de algo? Se a investigação os levasse a investigar a fundo a vida dos Fairchild, levando-as de volta à Boston, aquele simples caso de assassinato poderia se tornar muito mais confuso.
- Sem amigos, sem família por aqui – Rhodes disse em voz alta, quando elas já estavam chegando a Washington. – Uma irmã em Boston, ambos os pais falecidos. Se esse caso nos levar para Boston...
Chloe sorriu, feliz ao perceber como as duas estavam começando a pensar pelo mesmo caminho, com a mesma velocidade.
- Bem, não tinha uma anotação em algum lugar dos arquivos sobre um parente do Mark? Alguém que morava perto de Falls Church?
- Sim, um primo. Mas pelo que eu soube, ele está viajando. Férias, eu acho.
Rhodes respondeu com um tom de indiferença que fez Chloe perceber que seguir os rastros do primo de Mark dificilmente as levaria a algum lugar.
Perto de casa, Chloe vagarosamente permitiu-se pensar em assuntos mais pessoais. Ela estava seriamente considerando telefonar para Danielle para pedir desculpas por seu comportamento no dia anterior. Mas aquele tipo de conversa com Danielle geralmente se tornava uma discussão interminável, e ela não estava com forças para isso.
As duas agentes voltaram à sede do FBI, trocando o carro do bureau pelos seus próprios, e se separaram. Chloe pensou mais uma vez em Danielle antes de ir embora. Considerou ir até a nova casa da irmã—um apartamento que ela havia alugado em um local em que seu ex-namorado jamais imaginaria que ela estaria.
Por fim, Chloe decidiu não ir até lá. Ela sabia que tudo ficaria bem entre as duas—que às vezes, era preciso apenas tempo para que ambas ficassem de bem. Mesmo assim... sabia que não conseguiria dormir àquela hora. E com o caso Fairchild obrigatoriamente parado até a manhã seguinte, outra ideia surgiu em sua mente. Uma ideia que a fez estremecer por dentro, fazendo-a sentir-se um pouco mal. No entanto, por impulso, Chloe acabou agindo quase que imediatamente.
Virou à esquina e apontou o carro na direção do apartamento de seu pai.
***
Chloe não tinha intenção de vê-lo de fato e de conversar a sós com ele. Mas precisava provar a si mesma que era capaz de passar por aquele local. Aquilo precisaria acontecer em algum momento, para que ela pudesse então acalmar-se o quanto antes.
O apartamento de seu pai ficava a menos de meia hora da sede do FBI, e a menos de vinte minutos de seu apartamento, porém em outra direção. Eram 10:08 quando Chloe entrou no estacionamento. A casa dele era do tipo que ficava colada a outra, e a outra, e a outra, num complexo de apartamentos. Ela sabia qual era o carro dele—um Ford Focus usado—e o viu estacionado exatamente em frente ao complexo. Uma luz estava acesa e podia ser vista através da janela principal.
Chloe parou, sem desligar o carro, olhando pela janela e imaginando o que ele estaria fazendo. Ele estaria simplesmente vendo TV? Lendo, talvez? Chloe imaginou se, ao apagar aquela luz e ir para a cama, seu pai teria visões sobre o passado... suas filhas, sua esposa morta. Perguntou-se se a tortura e o medo pelos quais ele fizera suas filhas passarem o mantinham acordado à noite.
Chloe esperava que sim.
A raiva começou a tomar conta de seu corpo. Correu por suas veias, como se fosse um veneno, até que Chloe percebesse que já estava segurando o volante com força a ponto de machucar suas mãos.
Talvez eu devesse entrar ali agora, ela pensou. Bater na porta e acabar com tudo. Contar a ele que eu sei o que ele fez... que eu li o diário da mãe.
A ideia foi convincente o suficiente para fazer seu coração querer saltar do peito. Um surto de adrenalina tomou conta de suas veias enquanto Chloe pensava aquilo.
Mas obviamente, ela não poderia ir até lá. Pelo menos não ainda...
Chloe encontrou a vaga vazia mais próxima no estacionamento e a utilizou para fazer a volta. Ela seguiu para casa, sem perceber, até o primeiro semáforo, que ainda estava segurando o volante com toda sua força.
CAPÍTULO OITO
Havia sido muito alarmante para Danielle perceber que, quando seu último relacionamento terminara, ela ficara novamente desempregada. A ideia de ter um bar para si mesma e a visão de um futuro muito bom para ser verdade haviam lhe feito imaginar uma vida completamente diferente durante alguns meses. Mas ali estava ela novamente, sem namorado e sem um trabalho decente.
Danielle sempre conseguira esconder bem seu descontentamento com trabalhos ridículos, mas dessa vez, estava sendo mais difícil. Ela estava trabalhando como bartender em um clube de strip tease—que a gerência fazia questão de não chamar de strip club. Eles preferiam chamá-lo apenas de “clube” ou de “casa masculina”. Para Danielle, não importava como o local era chamado. A verdade é que havia mulheres no palco, mexendo o bumbum na cara dos homens, no ritmo de músicas de Bruno Mars.
Ela terminou de preparar o mojito para um cliente—tentando entender como alguém pedia um mojito em um strip club—e o entregou. Ele tinha cerca de cinquenta anos e, ao pegar a bebida, não fez questão de esconder que estava olhando para os peitos dela. Ele sorriu e deu um gole na bebida, sem tirar os olhos dos peitos de Danielle.
- Você deveria estar no palco, sabia? – ele disse. Por fim, olhou nos olhos dela, talvez para que Danielle pudesse ver a seriedade em seu olhar alcoolizado.
- Uou, nunca tinha ouvido essa. Que cantada original.
Confuso, o cliente acabou virando os olhos e depois afastando-se do bar, sentando-se perto do palco.
Sim, muitos caras já tinham dito que ela deveria estar no palco e não no bar. Seu gerente era um deles. E mesmo que já tivesse passado por trabalhos muito humilhantes, Danielle sabia que jamais aceitaria tirar a roupa para que homens vissem e lhe dessem cinco ou dez dólares na calcinha.
Ela sabia que aquele era um trabalho temporário. Tinha que ser. Mas Danielle não tinha certeza do que fazer para sair dali. Talvez ela devesse terminar a faculdade. Faltava ainda um ano e meio... e mesmo que já fosse estar com quase trinta anos ao se formar, pelo menos o diploma significaria algo.
Não que seu trabalho atual não tivesse suas vantagens. Ela estava lá há cerca de um mês, trabalhando quatro noites por semana. Na segunda semana, havia ganhado mais de setecentos dólares de gorjeta só para si. Mas o problema era a atmosfera daquele lugar. Mesmo quando garotas góticas dançavam músicas que Danielle até gostava, ela sentia que precisava sair dali o quanto antes.