*
Quando o avião aterrou, quatro pessoas esperavam para cumprimentar Riley e Jilly. Uma era um rosto familiar – Brenda Fitch, a assistente social que colocara Jilly ao cuidado de Riley. Brenda era uma mulher esbelta e nervosa com um sorriso caloroso e carinhoso.
Riley não reconheceu as outras três pessoas. Brenda abraçou Riley e Jilly e fez apresentações, começando com um casal de meia-idade, ambos fortes e sorridentes.
Brenda disse, “Riley, penso que não conheça Bonnie e Arnold Flaxman. Eles foram os pais adotivos de Jilly por um curto período depois que você a resgatou.”
Riley assentiu, lembrando como Jilly fugira do casal bem intencionado. Jilly estava determinada a viver somente com Riley. Riley esperava que os Flaxman não tivessem ressentimentos. Mas pareciam gentis e acolhedores.
Brenda então apresentou Riley a um homem alto com uma cabeça longa e de formato estranho, e um sorriso um tanto vazio.
Brenda disse, “Este é Delbert Kaul, nosso advogado. Vamos lá, vamos a algum lugar onde nos possamos sentar e conversar.”
O grupo dirigiu-se então até o café mais próximo. Os adultos tomaram café e Jilly pediu um refrigerante. Quando todos se sentaram, Riley lembrou que o irmão de Bonnie Flaxman era Garret Holbrook, um agente do FBI em Phoenix.
Riley perguntou, "Como está Garrett?"
Bonnie encolheu os ombros e sorriu. "Ah. Garrett é Garrett.”
Riley assentiu. Ela se lembrou do agente como um homem bastante taciturno com um comportamento frio. Mas nessa altura estava investigando o assassinato da meia-irmã de Garrett. Ele ficara grato quando ela resolveu o crime e ajudou a colocar Jilly em uma casa de acolhimento com os Flaxman. Riley sabia que ele era um bom homem apesar de aparentar frieza.
Brenda disse a Riley, "Fico feliz que você e Jilly tenham chegado aqui em tão pouco tempo. Eu realmente esperava que estivéssemos finalizando a adoção até agora, mas como escrevi para você em minha carta, nos deparamos com um problema. O pai de Jilly afirma que tomou a decisão de desistir de Jilly sob coação. Não só está contestando a adoção, como está ameaçando acusá-la de sequestro – e a mim como cúmplice.”
Examinando alguns documentos legais, Delbert Kaul acrescentou, “O caso dele é bem frágil. Mas não se preocupe com isso. Tenho a certeza de que podemos resolver tudo isso amanhã.”
De alguma forma, o sorriso de Kaul não era muito reconfortante para Riley. Havia algo fraco e incerto nele. Deu por si a pensar como ele havia sido designado para o caso.
Riley notou que Brenda e Kaul pareciam ter um relacionamento fácil. Não pareciam ser um casal romântico, mas antes bons amigos. Talvez tivesse sido por isso que Brenda o contratara.
Não necessariamente uma boa razão, Pensou Riley.
"Quem é o juiz?" Riley perguntou.
O sorriso de Kaul desapareceu um pouco quando disse, “Owen Heller. Não seria exatamente a minha primeira escolha, mas foi o melhor que conseguimos dadas as circunstâncias.”
Riley reprimiu um suspiro. Ela estava se sentindo cada vez menos segura. Esperava que Jilly não estivesse sentindo o mesmo.
Kaul então discutiu o que o grupo deveria esperar na audiência. Bonnie e Arnold Flaxman iam testemunhar sobre sua própria experiência com Jilly. Eles enfatizariam a necessidade da garota ter um ambiente doméstico estável, que não poderia ter com o pai.
Kaul disse que gostaria que o irmão mais velho de Jilly testemunhasse, mas ele havia desaparecido há muito tempo e Kaul não conseguiu localizá-lo.
Riley deveria testemunhar sobre o tipo de vida que ofereceu a Jilly. Viera para Phoenix armada com todo o tipo de documentação para basear suas reivindicações, incluindo informações financeiras.
Kaul bateu com o lápis na mesa e acrescentou, “Agora, Jilly, você não precisa testemunhar…”
Jilly interrompeu. "Eu quero. Eu vou."
Kaul pareceu um pouco surpreso com a nota de determinação na voz de Jilly. Riley desejou que o advogado parecesse tão determinado quanto Jilly.
"Bem" Disse Kaul, "vamos considerar isso resolvido".
Quando a reunião terminou, Brenda, Kaul e os Flaxman foram embora juntos. Riley e Jilly alugaram um carro, e depois foram para um hotel próximo onde fizeram o check-in.
*
Assim que se acomodaram no quarto de hotel, Riley e Jilly pediram uma pizza. A TV passava um filme que elas já tinham visto e não prestaram muita atenção. Para alívio de Riley, Jilly não parecia nem um pouco ansiosa agora. Conversaram agradavelmente sobre pequenas coisas, como o próximo ano letivo de Jilly, roupas e sapatos, e celebridades nas notícias.
Riley achava difícil acreditar que Jilly estava em sua vida há tão pouco tempo. As coisas pareciam tão naturais e fáceis entre elas.
Como se sempre tivesse sido minha filha, Pensou Riley. Percebeu que era exatamente como se sentia, mas isso provocou uma renovada explosão de ansiedade.
Terminaria tudo amanhã?
Riley não conseguia pensar em como isso seria.
Elas estavam quase terminando sua pizza quando foram interrompidas por um toque alto do laptop de Riley.
"Oh, deve ser April!" Disse Jilly. "Ela prometeu que falaríamos".
Riley sorriu e deixou Jilly atender a ligação de sua filha mais velha. Riley ouvia as duas garotas conversando como irmãs em que se tinham transformado.
Quando as garotas terminaram de falar, Riley falou com April enquanto Jilly se sentou na cama para assistir TV. O rosto de April parecia sério e preocupado.
Ela perguntou, "Como estão as coisas para amanhã, mamãe?"
Olhando por toda a sala, Riley viu que Jilly se interessara pelo filme novamente. Riley não achava que ela estava ouvindo o que ela e April estavam falando, mas queria ter cuidado.
"Vamos ver" Disse Riley.
April falou em voz baixa para que Jilly não pudesse ouvir.
"Você parece preocupado, mamãe."
"Estou sim" Disse Riley, falando em voz baixa.
“Você vai conseguir, mamãe. Eu sei que você consegue."
Riley engoliu em seco.
"Espero que sim" Disse ela.
Ainda falando baixinho, a voz de April tremia de emoção.
"Nós não podemos perdê-la, mamãe. Ela não pode voltar a esse tipo de vida.”
"Eu sei" Disse Riley. "Não se preocupe."
Riley e April se entreolharam em silêncio por alguns instantes. De repente, Riley sentiu-se profundamente comovida com a maturidade que sua filha de quinze anos demonstrava naquele momento.
Ela está realmente crescendo, Riley pensou orgulhosamente.
April finalmente disse, "Bem, eu vou deixar você ir. Ligue para mim assim que souber de alguma coisa.”
"Eu vou fazer isso" Disse Riley.
Ela terminou a videochamada e voltou a se sentar na cama com Jilly. O filme estava terminando quando o telefone tocou. Riley sentiu outra onda de preocupação.
Ultimamente, os telefonemas não traziam boas notícias.
Pegou no telefone e ouviu a voz de uma mulher.
"Agente Paige, estou ligando da central telefônica de Quantico. Recebemos uma ligação de uma mulher em Atlanta e… bem, não sei como lidar com isso, mas ela quer falar diretamente com você.”
"Atlanta?" Riley perguntou. "Quem é?"
"O nome dela é Morgan Farrell."
Riley sentiu um calafrio de alarme.
Ela se lembrou da mulher de um caso em que trabalhara em fevereiro. O marido rico de Morgan, Andrew, havia sido suspeito em um caso de assassinato. Riley e seu parceiro, Bill Jeffreys, entrevistaram Andrew Farrell em casa e determinaram que ele não era o assassino que estavam procurando. No entanto, Riley tinha visto sinais de que o homem estava abusando de sua esposa.
Ela silenciosamente havia deixado para Morgan um cartão do FBI, mas nunca lhe tinha ligado.
Eu acho que ela finalmente quer ajuda, Riley pensou, imaginando a mulher magra, elegante, mas tímida que tinha visto na mansão de Andrew Farrell.
Mas Riley se perguntou – o que poderia ela fazer fazer por alguém em suas atuais circunstâncias?
Na verdade, a última coisa no mundo que Riley precisava agora era outro problema para resolver.
A operadora perguntou, "Você quer que eu faça a ligação?"
Riley hesitou por um segundo e disse, "Sim, por favor."
Em um momento, ouviu o som da voz de uma mulher.
"Olá, estou falando com a agente especial Riley Paige?"
Agora ocorria-lhe – ela não conseguia se lembrar de Morgan ter dito uma única palavra enquanto lá estiversaá. Parecia muito apavorada com o marido para falar.
Mas agora não parecia aterrorizada.
Na verdade, parecia bastante feliz.
Será apenas um telefonema de circunstância? Riley se perguntou.
"Sim, fala Riley Paige" Disse ela.
“Bem, eu apenas pensei que lhe devia um telefonema. Você foi muito gentil comigo naquele dia em que visitou nossa casa e me deixou seu cartão, e parecia estar preocupada comigo. Eu só queria que soubesse que já não precisa mais se preocupar comigo. Tudo vai ficar bem agora.”
Riley ficou aliviada por saber.
"Fico feliz em ouvir isso” Disse ela. “Você o deixou? Está se divorciando?”
"Não" Disse Morgan alegremente. "Eu matei o filho da mãe."
CAPÍTULO DOIS
Riley sentou-se na cadeira mais próxima, sua mente cambaleando enquanto as palavras da mulher ecoavam na sua cabeça.
"Eu matei o filho da mãe."
Morgan realmente disse isso?
Então Morgan perguntou, "Agente Paige, ainda está aí?"
"Ainda estou aqui" Disse Riley. "Conte-me o que aconteceu."
Morgan ainda soava estranhamente calma.
“O problema é que não tenho a certeza. Tenho andado bastante dopada ultimamente e eu não lembro das coisas que faço. Mas eu matei ele. Estou olhando para o corpo dele deitado na cama e tem ferimentos de faca, e sangrou muito. Parece que o matei com uma faca de cozinha afiada. A faca está ao lado dele.”
Riley se esforçou para entender o que estava ouvindo.
Ela se lembrava de como Morgan parecera doentiamente magra. Riley tinha certeza de que ela era anoréxica. Riley sabia melhor do que ninguém como era difícil esfaquear uma pessoa até a morte. Morgan seria fisicamente capaz de fazer uma coisa dessas?
Ouviu Morgan suspirar.
“Peço desculpa por incomodar, mas sinceramente não sei o que fazer a seguir. Será que me poderia ajudar?"
“Você contou a mais alguém? Chamou a polícia?”
"Não."
Riley gaguejou, "Eu vou … eu vou tratar disso."
"Oh, muito obrigada."
Riley estava prestes a dizer a Morgan para ficar em linha enquanto ela fazia uma outra chamada a partir de seu celular. Mas Morgan desligou.
Riley ficou olhando para o espaço por um momento. Ouviu Jilly perguntar, "Mamãe, tem alguma coisa errada?"
Riley olhou e viu que Jilly parecia profundamente preocupada.
Disse, "Nada para se preocupar, querida."
Então ela pegou o celular e ligou para a polícia em Atlanta.
*
O policial Jared Ruhl sentia-se entediado e inquieto no banco do passageiro ao lado do sargento Dylan Petrie. Era noite e eles estavam patrulhando um dos bairros mais ricos de Atlanta – uma área onde raramente havia atividade criminosa. Ruhl era novo na polícia e estava ansioso por um pouco de ação.
Ruhl tinha todo o respeito do mundo por seu parceiro e mentor afro-americano. O sargento Petrie estava na polícia há vinte anos ou mais, e era um dos policiais mais experientes da região.
Então, por que estamos nesse ritmo? Ruhl se perguntou.
Como se em resposta à sua pergunta não verbalizada, uma voz feminina insinuou-se no rádio…
"Quatro-Frank-Treze, ouve-me?"
Os sentidos de Ruhl se aguçaram ao ouvir a identificação de seu próprio veículo.
Petrie respondeu, "Ouvimos, fale."
A operadora hesitou, como se não acreditasse no que estava prestes a dizer.
Então disse, “Temos um possível um-oitenta-sete na casa dos Farrell. Vão para a cena.”
A boca de Ruhl se abriu e ele viu os olhos de Petrie se arregalarem de surpresa. Ruhl sabia que 187 era o código para um homicídio.
Na casa de Andrew Farrell? Ruhl se perguntou.
Não podia acreditar no que ouvia e Petrie parecia também surpreendido.
"Repita" Disse Petrie.
“Um possível 187 na casa dos Farrell. Podem ir lá?”
Ruhl viu Petrie piscar os olhos com perplexidade.
"Sim" Disse Petrie. "Quem é o suspeito?"
A operadora hesitou novamente, depois disse, “A senhora Farrell.”
Petrie ofegou em voz alta e meneou a cabeça.
"Uh … isso é uma piada?" Perguntou.
"Não é brincadeira."
"Quem é o meu RP?" Petrie perguntou.
O que isso significa? Ruhl perguntou a si mesmo.
Ah sim…
Isso significava, "Quem denunciou o crime?"
A operadora respondeu, “Um agente da UAC ligou de Phoenix, Arizona. Eu sei o quão estranho isso soa, mas…”
A operadora ficou em silêncio.
Petrie disse, "Código Três resposta?"
Ruhl sabia que Petrie estava perguntando se usaria luzes intermitentes e uma sirene.
A operadora perguntou, "A que distância estão do local?"
"Menos de um minuto" Disse Petrie.
“Então é melhor não dar nas vistas. Isso tudo é…”
Sua voz se apagou novamente. Ruhl adivinhou que estava preocupada em não chamarem muita atenção. O melhor era manter a mídia de fora o máximo de tempo possível em relação ao que estivesse realmente acontecendo nesse bairro luxuoso e privilegiado.
Finalmente, a operadora disse, "Verifiquem, ok?"
“Certo,” Disse Petrie. "Estamos a caminho."
Petrie carregou no acelerador e percorreram a rua tranquila.
Ruhl olhou espantado ao se aproximarem da mansão Farrell. Nunca tinha estado tão próximo do locale. A casa era enorme e parecia-lhe mais um country club do que a casa de alguém. O exterior estava cuidadosamente iluminado – para proteção, sem dúvida, mas também para mostrar seus arcos e colunas e grandes janelas.
Petrie estacionou o carro em frente da casa e desligou o motor. Ele e Ruhl saíram e foram para a imensa entrada da frente. Petrie tocou a campainha.
Depois de alguns momentos, um homem alto e magro abriu a porta. Ruhl deduziu pelo smoking que vestia e pela sua expressão austera que era o mordomo da família.
Pareceu surpreso ao ver os dois policiais – e nem um pouco satisfeito.
"Posso perguntar sobre o que é tudo isso?" Perguntou.
O mordomo não parecia ter nenhuma ideia de que poderia haver problemas dentro daquela mansão.
Petrie olhou para Ruhl, que percebeu o que seu mentor estava pensando…
Apenas um falso alarme.
Provavelmente uma brincadeira.
Petrie disse ao mordomo, "Podemos falar com o Sr. Farrell, por favor?"
O mordomo sorriu de maneira arrogante.
"Receio que isso seja impossível" Disse ele. "O patrão está dormindo e eu tenho ordens muito rigorosas…"
Petrie interrompeu, "Temos motivos para nos preocupar com sua segurança".
As sobrancelhas do mordomo se ergueram.
“De verdade?” Disse. "Já que insistem, vou ver se está bem. Vou tentar não acordá-lo. Garanto-lhe que reclamaria de forma bastante vociferante.”
Petrie não pediu permissão para ele e Ruhl seguirem o mordomo até a casa. O lugar era vasto por dentro, com fileiras de colunas de mármore que conduziam a uma escada de carpetes vermelhos com corrimões curvos e elegantes. Ruhl achava cada vez mais difícil acreditar que alguém pudesse morar ali. Parecia mais um set de filmagem.
Ruhl e Petrie seguiram o mordomo pelas escadas e atravessaram um corredor largo até um par de portas duplas.
"A suíte principal" Disse o mordomo. "Espere aqui um momento."
O mordomo transpôs as portas.
Então o ouviram soltar um grito de horror no interior.
Ruhl e Petrie abriram as portas até uma sala de estar e de lá para um enorme quarto.
O mordomo já tinha acendido as luzes. Os olhos de Ruhl quase doeram por um momento do brilho da enorme sala. Então seus olhos viram uma cama coberta de dossel. Como tudo o mais na casa, também era enorme, como algo saído de um filme. Mas, por maior que fosse, era diminuída pelo tamanho do resto do quarto.