Ele estava morto, com a adaga de Thanos no seu coração. Thanos conseguia sentir o sangue de Lucious nas suas mãos, e parecia haver muito num só corpo. Uma pequena parte dele esperava que houvesse ali algo diferente, que houvesse ali algum sinal da loucura que tinha dominado Lucious, ou do mal que parecia que o tinha preenchido. Em vez disso, Lucious era apenas uma concha silenciosa e vazia.
Thanos queria fazer algo, naquele momento, pelo seu irmão; vê-lo enterrado, ou entregá-lo a um padre pelo menos. Mesmo quando pensava nisso, ele sabia que não podia. As próprias palavras do seu irmão significavam que tal era impossível.
Felldust estava a invadir o Império, e se Thanos queria ser capaz de fazer qualquer coisa para ajudar as pessoas com quem ele se preocupava, ele tinha de ir naquele momento.
Ele levantou-se, apanhando a sua espada, pronto para correr pela porta. Ele também levou a de Lucious. De todas as coisas que o seu irmão tinha mantido perto, as ferramentas da violência pareciam as mais próximas. Thanos ficou ali com as duas nas suas mãos, surpreendido ao descobrir o quão bem elas combinavam. Ele ficou quase tão surpreendido ao encontrar uma coleção de clientes da estalagem a bloquearem o seu caminho.
“Ele disse que tu eras o príncipe Thanos”, disse um homem de barba espessa, tocando com os dedos na ponta de uma faca. “Isso é verdade?”
“Os pedregulhos vão pagar um bom dinheiro por um prisioneiro como tu”, disse outro.
Um terceiro assentiu. “E se não o fizerem, os traficantes de escravos fá-lo-ão.”
Eles começaram a avançar e Thanos não esperou. Em vez disso, ele atacou. O seu ombro foi de encontro ao mais próximo, derrubando-o contra uma mesa. Thanos já estava a atacar, golpeando o braço do homem da faca.
Thanos ouviu-o gritar quando a lâmina lhe cortou o antebraço, mas ele já estava em movimento, pontapeando o terceiro homem de volta para um lugar onde quatro homens não tinham parado de jogar dados, mesmo para a batalha que ele tinha acabado de ter com Lucious. Um deles rosnou e virou-se, agarrando o bandido.
Em momentos, a estalagem conseguiu fazer o que não tinha conseguido quando tinha sido Lucious a lutar: entrou em erupção numa briga em grande escala. Homens que se tinham contentado em ficar por ali enquanto Thanos e o seu irmão trocavam golpes de espada agora atiravam socos e desembainhavam facas. Um agarrou uma cadeira, balançando-a na direção da cabeça de Thanos. Thanos esquivou-se, arrancando um pedaço da madeira enquanto redirecionava o balanço para um outro patrono.
Ele poderia ter ficado para lutar, mas pensar no perigo em que Ceres poderia estar forçou-o a uma corrida. Ele tinha tido tanta certeza de que poderia parar a invasão se conseguisse chegar a Lucious, e então haveria tempo suficiente para encontrar a verdade sobre a sua filiação, descobrir as provas de que ele precisava e voltar para Delos. Agora, não havia tempo para nada disso.
Thanos correu para a porta. Ele caiu e derrapou sob as mãos de um homem que o agarrou e que o tentou parar, raspando um corte raso na sua coxa. Ele correu para as ruas...
... diretamente para alguma da pior poeira que Thanos tinha visto desde que tinha vindo para a cidade. Ele não abrandou. Ele apenas enfiou as suas lâminas gémeas no cinto, puxou o seu lenço contra a poeira e avançou o melhor que conseguiu.
Atrás dele, Thanos conseguia ouvir os sons dos homens que tentavam segui-lo, embora como eles esperavam vê-lo bem o suficiente para o conseguir apanhar com aquele tempo, ele não sabia. Thanos apalpava o seu caminho como um cego, passando por um comerciante que estava a guardar a sua carroça, e, depois, por um par de soldados que maldiziam enquanto se amontoavam numa porta contra a poeira.
“Olhem aquele louco!”, ouviu Thanos um deles a gritar na língua de Felldust.
“Provavelmente apressando-se para se juntar à invasão. Ouvi que o Quarto Pedregulho Vexa começou a enviar mais de uma frota, enquanto os outros três ainda estão a conspirar. O Primeiro Pedregulho antecipou-se a eles. “
“Antecipa-se sempre”, respondeu o primeiro.
Porém, Thanos já se tinha afastado para a poeira, procurando a sua rota pelas formas vagas dos prédios, observando os sinais que pendiam acima nas ruas, iluminados por lâmpadas a óleo. Havia esculturas de pedra também, obviamente destinadas a que os moradores locais conseguissem encontrar o seu caminho a partir da rua do urso esculpido para a rua das cobras atacadas através do toque, se necessário.
Thanos não conhecia suficientemente o sistema para conseguir usá-lo, mas mesmo assim, ele continuava através da poeira.
Havia outros a fazer o mesmo, e, por várias vezes, Thanos parou, tentando descobrir se os pés que ele ouvia eram dos perseguidores ou não. Certa vez, ele continuou para trás de uma massa de ferro curvado de um quebra-vento, com as suas espadas encontrando o seu caminho nas suas mãos, certo de que aqueles que o seguiam desde a estalagem o tinham alcançado.
Em vez disso, um grupo de escravos passou a correr, com os rostos cobertos contra a poeira, carregando um palanquim de dentro do qual Thanos conseguia ouvir um comerciante a instiga-los.
“Mais rápido, seus canalhas! Mais rápido, ou mando-vos empalar. Precisamos de chegar ao porto antes de perdermos os saques.
Thanos viu-os, seguindo-os atrás do palanquim, partindo do princípio que aqueles que o carregavam provavelmente conheciam o caminho melhor do que ele. Ele não conseguia acompanhá-los de muito de perto, porque numa cidade como o Porto do Sotavento, todos se mantinham de olho em potenciais ladrões ou assassinos, mas mesmo assim, ele conseguiu segui-lo ao longo de várias ruas antes de desaparecer na poeira.
Thanos permaneceu ali por um segundo ou dois, recuperando o fôlego, e, assim que o recuperou, a tempestade de poeira levantou-se, dando-lhe uma visão sobre o porto.
O que Thanos viu ali fê-lo ficar de pé e olhar fixamente.
Ele tinha pensado que havia muitos navios no porto antes. Agora, parecia que a água estava repleta deles, até parecer que Thanos poderia ter andado até ao horizonte no seu convés.
Muitos deles eram navios de guerra, mas muitos mais agora eram embarcações mercantes ou embarcações menores. Uma vez que a frota principal já partira de Felldust, o porto deveria estar vazio, mas parecia-lhe a Thanos que não haveria espaço suficiente ali para outro barco. Parecia que todos em Felldust tinham ido para ali, prontos para levar a sua parte do que deviam ganhar no Império.
Naquele momento, Thanos começou a ver a escala daquilo, e o que aquilo significava. Aquele não era apenas um exército invasor, mas um país inteiro. Eles haviam visto uma oportunidade de conquistar terras que lhes haviam sido negadas há muito tempo, e eles iriam adquiri-las pela força agora.
Independentemente do que significasse para aqueles que já lá estavam.
“Quem és tu?”, perguntou um soldado, aproximando-se dele. “Que frota, que capitão?”
Thanos pensou rapidamente. A verdade significaria outra luta, e agora não havia o véu acolhedor da poeira para se esconder. Ele não tinha dúvida de que estava tão revestido com poeira como qualquer um dos nativos, mas se alguém adivinhasse quem ele era, ou mesmo apenas que ele era do Império, aquilo não iria acabar bem.
Ele questionou-se brevemente sobre o que eles haviam feito aos espiões em Felldust. Fosse o que fosse, não seria agradável.
“Com que frota estás?”, perguntou o homem novamente, desta vez com uma voz áspera.
“Quarto Pedregulho de Vexa”, ripostou Thanos, fazendo a sua voz igualmente áspera. Ele tentou injetar a sensação de que não tinha tempo para tais interrupções. Não era difícil fazer isso naquele momento, quando ele tinha tão pouco tempo para voltar para ajudar Ceres. “Por favor, diz-me que não é verdade que a frota dela já saiu.
O outro homem riu-se na cara dele. “Parece que estás sem sorte. O quê, pensavas que poderias estar por ai, a dizer adeus à prostituta favorita da tua tripulação? Se desperdiças tempo, desperdiças a tua hipótese.”
“Maldição!”, disse Thanos, tentando desempenhar o seu papel. “Eles não se podem todos ter ido embora. E outros navios?”
Ele deu outra gargalhada. “Podes perguntar se quiseres, mas se achas que não há uma tripulação que esteja completa agora, não tens estado a prestar atenção. Para colheitas como esta, todos querem um lugar. Metade deles mal consegue lutar. Mas, talvez eu conseguisse encontrar um lugar para ti numa das tripulações de Old Forkbeard. O Terceiro Pedregulho está a levar o seu tempo. Eu só pediria metade do que tu obtivesses.”
“Talvez se eu não conseguir encontrar os rapazes com quem deveria estar”, disse Thanos. Cada segundo que ele estava ali era um segundo em que ele não estava a navegar de volta para Delos com uma tripulação que não iria tentar matá-lo no momento em que descobrisse quem ele era.
Ele viu o outro homem encolher os ombros. “Não vais conseguir uma oferta melhor a esta hora.
“Vamos ver”, disse Thanos, e partiu entre os barcos.
Observado de fora, devia ter parecido como se ele estivesse à procura de um dos raros barcos da frota que ele havia pretendido, embora Thanos esperasse não encontrar nenhum. A última coisa que ele queria era ingressar à força na marinha de Felldust.
Porém, ele fá-lo-ia, se o tivesse de fazer. Se significasse voltar para Ceres, se significasse ser capaz de ajudá-la, ele arriscaria. Ele faria o papel de um qualquer guerreiro de Felldust, ansioso para acompanhar. Se tivesse sido a frota principal a estar ali, ele até a poderia ter escolhido em primeiro lugar, tentando aproximar-se o mais possível do Primeiro Pedregulho para matá-lo.
Agora, porém, se ele navegasse juntamente com aquela segunda frota, ele não chegaria lá até que fosse tarde demais. Ele certamente não seria capaz de ajudar. Assim, ele caminhou pelas tábuas entre os muitos navios, observando os guerreiros a carregarem barris de água fresca e caixas de comida. Thanos abriu rachas em pelo menos três barris, mas nenhuma pequena sabotagem pararia uma frota como aquela.
Em vez disso, ele continuou a olhar. Ele viu homens e mulheres a aperfeiçoar armas e a encadear escravos dos remos no lugar. Ele viu sacerdotes cobertos de poeira entoando orações para a boa sorte, sacrificando animais de maneiras que transformavam a poeira em lama sangrenta. Ele viu dois grupos de soldados sob diferentes bandeiras a discutir sobre qual deles ia primeiro ao longo de um cais.
Thanos viu muita coisa que o deixou irritado, e mais, isso deixou-o assustado por Delos. Só havia uma coisa que ele não conseguia encontrar entre o caos das docas, e era a única coisa que ele tinha ido ali para encontrar. Havia ali centenas de barcos, de todas as formas, tamanho e estilos. Havia barcos cheios até à borda com guerreiros com um aspeto rude, e barcos que pareciam pouco mais do que barcaças de prazer glorificadas, ali para levar pessoas para verem a invasão tanto como participarem nela.
O que ele não conseguia ver era o barco que o trouxera ali. Ele precisava de voltar para Ceres, e, naquele momento, Thanos não sabia como o ia fazer.
CAPÍTULO QUATRO
Stephania correu pelo do castelo, pressionada pelo som das cornetas de guerra, como um cervo na frente de um grupo de caça. Se ela não saísse naquele momento, não haveria forma de fugir. Ela tinha feito o suficiente quando se tratava de Ceres.
“Que Felldust acabe com ela”, disse Stephania.
Ela refez os seus passos pelo castelo, até ao ponto onde ele se ligava aos túneis sob a cidade. Ela esperava que Elethe tivesse mantido a sua rota de fuga aberta como Stephania tinha ordenado. Agora era um momento para fugir. Se elas fossem apanhadas pela rebelião, isso seria mau o suficiente, mas ser apanhado no meio de uma batalha entre isso e os Cinco Pedregulhos de Felldust seria muito pior.
Exceto…
Stephania fez uma pausa, olhando para fora através de uma janela em direção ao porto. Ela conseguiu ver o céu escuro com projéteis e os navios em fogo quando uma fita escura de barcos invasores se aproximou. Stephania correu para um lugar onde ela conseguisse espreitar para fora sobre as muralhas, e ela conseguiu ver fogos para lá daquele ponto, também.
Para onde quer que ela corresse naquele momento, parecia que haveria inimigos. Ela não poderia simplesmente escapar-se sobre a água, da forma como ela havia entrado em Delos. Ela não podia arriscar escapar para céu aberto, porque se fosse ela a comandar a invasão, haveria pelotões invasores para conduzir as pessoas de volta para a cidade. Ela não podia arriscar vaguear por Delos abertamente, porque as forças da rebelião iriam tentar raptá-la.
No entanto, onde estavam aqueles soldados? Stephania tinha passado por alguns guardas quando estava a entrar. O seu disfarce tinha sido mais do que suficiente para ela ter conseguido passar por eles. Porém, não tinha havido muitos. O castelo tinha a sensação de um navio fantasma, abandonado em face de assuntos mais urgentes. Olhando para o longe, Stephania conseguia ver rebeldes a deslocarem-se através das ruas com armaduras brilhante e panos aos retalhos. Haveria algumas figuras por perto, mas quantas, e onde?
Lentamente Stephania teve uma ideia, mais como uma possibilidade do que uma realidade. No entanto, quanto mais pensava nisso, mais parecia ser a sua melhor opção. Ela não era de mergulhar sem pensar. Nos círculos da nobreza, tal era uma maneira de colocar-se no poder de outra pessoa, ou dar por si a ser expulso, ou pior.
Havia vezes, porém, em que uma ação decisiva era a resposta. Quando havia um prémio para levar, hesitar poderia fazer perdê-lo tão certamente quanto desejá-lo intensamente.
Stephania foi até Elethe, que estava a olhar para trás e para frente entre os túneis e a cidade como se esperasse que uma horda de inimigos chegasse a qualquer momento.
“Está na hora de ir embora, minha senhora?”, perguntou Elethe. “Ceres está morta?”
Stephania abanou a cabeça. “Houve uma mudança de planos. Vem comigo.”
Para crédito da sua aia, Elethe não hesitou. Ela caminhou juntamente com Stephania apesar das preocupações que ela deve ter tido.
“Para onde estamos a ir?”, perguntou Elethe.
Stephania sorriu. “Para as masmorras. Eu decidi que estás a entregar-me à rebelião.”
Tal provocou um olhar chocado na sua aia, embora não fosse nada em comparação com a surpresa que ela teve quando Stephania lhe explicou mais sobre o seu plano.
“Estás pronta?”, perguntou Stephania, ao se aproximarem das masmorras.
“Sim, minha senhora”, disse Elethe.
Stephania colocou as suas mãos atrás das costas, como se amarradas e, depois, caminhou para a frente com o que ela esperava ser uma demonstração adequada de uma contrição assustadora. Elethe estava a fazer um trabalho surpreendentemente bom ao parecer-se como uma rebelde severa com um inimigo recém-capturado.
Dois guardas estavam sentados perto da porta principal, atrás de uma mesa com cartas postas, mostrando como eles estavam a passar o seu tempo. Algumas coisas não mudavam, independentemente de quem estava ao comando.
Eles olharam para cima quando Stephania se aproximou. Ela ficou bastante bem-disposta com a surpresa que viu ali.
“É... tu capturaste Lady Stephania?”, perguntou um.
“Como é que fizeste isso?”, perguntou o outro. “Onde é que a encontraste?”
Stephania conseguiu ouvir a descrença e conseguiu também perceber que eles não sabiam o que fazer a seguir.