Vadia, Prisioneira, Princesa - Морган Райс 4 стр.


Ele fez um desvio por entre as tendas, naquele momento, mudando de direção ligeiramente para passar por uma das tendas da messe, onde um dia atrás, um dos cozinheiros tinha precisado de ajuda para compor uma mensagem para casa. O exército mal alimentava os seus recrutas e Sartes sentia o seu estômago a fazer barulho com a perspetiva de comida, mas ele não comeu o que levava consigo enquanto corria para a tenda do seu comandante.

"Por onde é que tens andado?", exigiu saber o oficial. O seu tom deixou claro que ter-se atrasado por causa de outros soldados não contaria como uma desculpa. Mas Sartes já sabia disso. Era parte da razão pela qual ele tinha ido à tenda da messe.

"A apanhar isto no caminho, senhor", disse Sartes, estendendo a tarte de maçã que ele tinha ouvido que era a favorita do oficial. "Eu sabia que hoje talvez não a conseguisses obter."

O comportamento do oficial mudou instantaneamente. "Isso é muito atencioso, recruta..."

"Sartes, senhor". Sartes não se atreveu a sorrir.

"Sartes. Davam-nos jeito alguns soldados que soubessem pensar. Embora, da próxima vez, lembra-te de que as ordens têm de vir primeiro."

"Sim, senhor", disse Sartes. "Há alguma coisa que precisas que eu faça, senhor?"

O oficial fez-lhe sinal com a mão para se ir embora. "Neste momento não, mas vou lembrar-me do teu nome. Podes retirar-te."

Sartes deixou o pavilhão do comandante sentindo-se muito melhor do que quando tinha entrado. Ele não tinha certeza de que o pequeno ato fosse suficiente para salvá-lo após o atraso que os soldados tinham causado. Por enquanto, porém, ele parecia ter evitado a punição, tendo conseguido chegar a uma posição em que um oficial sabia quem ele era.

Parecia a ponta da navalha, mas para Sartes todo o exército lhe parecia assim. Até àquele momento, ele tinha sobrevivido no exército por ser inteligente, e por se manter um passo à frente do pior da violência por aqueles lados. Ele tinha visto rapazes da sua idade mortos ou espancados com tanta violência que era óbvio que iriam morrer em pouco tempo. Mesmo assim, ele não tinha certeza se seria capaz de manter-se assim muito tempo. Para um recruta como ele, aquele era o tipo de lugar onde a violência e a morte só poderiam ser adiadas tanto tempo.

Sartes engolia em seco ao pensar em todas as coisas que podiam correr mal. Um soldado podia levar um espancamento demasiado longe. Um oficial podia ofender-se com qualquer pequena ação e ordenar uma punição concebida para dissuadir os outros com a sua crueldade. Ele podia ser empurrado para a batalha a qualquer momento, e ele tinha ouvido falar que os recrutas iam na linha da frente para "eliminar os fracos." Mesmo os treinos podiam ser mortais, quando o exército tinha pouco uso de armas contundentes e os recrutas recebiam pouca instrução real.

O único medo que todos tinham era de que alguém descobrisse que ele tinha tentado juntar-se a Rexus e aos rebeldes. Não deveria haver maneira de o conseguirem, mas até mesmo a mais ínfima possibilidade era suficiente para compensar todos as outras. Sartes tinha visto o corpo de um soldado acusado de ter simpatias junto dos rebeldes. A própria unidade a que ele pertencia tinha sido ordenada a cortá-lo em pedaços para provar a sua lealdade. Sartes não queria acabar assim. Bastava-lhe pensar naquilo para que o seu estômago se apertasse para além da fome.

"Tu aí!", chamou uma voz. Sartes assustou-se. Era impossível afastar a sensação de que talvez alguém tivesse adivinhado o que ele estava a pensar. Obrigou-se a pelo menos fingir estar calmo. Sartes olhou em volta e viu um soldado com a armadura elaborada e musculosa de um sargento, com marcas tão profundas de varíola nas suas bochechas que eram quase como uma outra paisagem. "És o mensageiro do capitão?"

"Eu acabei de lhe vir trazer uma mensagem, senhor", disse Sartes. Não era bem uma mentira.

"Então és suficiente bom para mim. Vai e descobre para onde foram os carrinhos com o meu material de madeira. Se alguém te causar problemas, diz-lhe que Venn te enviou ".

Sartes saudou apressadamente. "É para já, senhor."

Ele correu para a missão, mas não estava concentrado no que tinha em mãos. Ele foi por um caminho mais longo, mais tortuoso. Um caminho que lhe permita espionar os arredores do acampamento, os seus pontos de estrangulamento, um caminho que lhe permitia espiar quaisquer pontos fracos.

Porque, morto ou não, Sartes iria encontrar uma maneira de escapar naquela noite.

CAPÍTULO CINCO

Lucious abria caminho por entre a multidão de nobres na sala do trono do castelo, fumegando. Ele irritava-se com o facto de que ter de fazer o seu caminho aos empurrões, quando toda a gente ali se devia afastar para o lado e fazer-lhe uma vénia, abrindo caminho para ele passar. Ele irritava-se com o facto de Thanos receber toda a glória, por ter acabado com os rebeldes em Haylon. Acima de tudo, porém, ele irritava-se com a forma como as coisas tinham acontecido no Stade. Aquela prostituta, Ceres, havia arruinado os seus planos mais uma vez.

À frente, Lucious podia ver o rei e a rainha em profunda conversa com Cosmas, o velho tolo da biblioteca. Lucious tinha pensado que tinha visto o último dos estudiosos de idade quando criança, quando era suposto eles todos aprenderem factos absurdos sobre o mundo e o seu funcionamento. Mas não, aparentemente, na sequência da carta que ele tinha fornecido, mostrando a verdadeira traição de Ceres, Cosmas tinha de ser ouvido pelo seu rei.

Lucious continuava a avançar aos empurrões. À sua volta, ele ouvia os nobres da corte a conspirarem. Ele via a sua prima distante, Stephania, não muito longe, a rir-se de alguma piada que outra miúda nobre com uma apresentação perfeita fizera. Ela olhou por cima, apanhando o olhar de Lucious o tempo suficiente para lhe sorrir. Lucious decidiu que ela era, de facto, uma verdadeira cabeça oca. Mas bela. Talvez no futuro, ele pensou, pudesse haver uma oportunidade de passar mais tempo com a miúda nobre. Ele era pelo menos tão impressionante quanto Thanos.

Por enquanto, porém, a raiva de Lucious pelo que tinha acontecido era demasiado grande, para que até mesmo aqueles pensamentos o distraíssem. Ele caminhou até aos pés dos tronos, diretamente até à tribuna que lá se erguia.

"Ela ainda está viva!", deixou ele escapar enquanto se aproximava do trono. Ele não se importava que fosse alto o suficiente para se ouvir por toda a câmara. Deixai-os ouvir, decidiu. Certamente não fazia diferença que Cosmas ainda estivesse a sussurrar para o rei e para a rainha. Lucious indagava-se sobre o que poderia um homem que passava o seu tempo em torno de pergaminhos, eventualmente, ter para dizer que valesse a pena?

"Ouviste-me?", disse Lucious. "A miúda ainda está…"

"Viva, sim", disse o rei, parando-o com uma mão levantada para o silêncio. "Estamos a discutir assuntos mais importantes. Thanos está desaparecido na batalha por Haylon."

O gesto foi apenas mais uma coisa a acrescentar à raiva de Lucious. Ele estava a ser tratado como um servo que se mandava calar, ele pensou. Mesmo assim, ele esperou. O rei não se podia irritar com ele. Além disso, ele precisou de alguma tempo para digerir o que acabara de ouvir.

Thanos estava desaparecido? Lucious tentou perceber como é que isso o afetava. Isso mudaria a sua posição dentro da corte? Ele deu por si a olhar para Stephania novamente, pensativo.

"Obrigado, Cosmas", disse a rainha finalmente.

Lucious observou o discípulo a descer de volta para a multidão de nobres que assistia. Só então o rei e a rainha lhe deram a sua atenção. Lucious tentou ficar em sentido. Ele não deixaria que os outros vissem nem um pouco do ressentimento que o consumia por causa do pequeno insulto. Lucious dizia para si mesmo que se outras pessoas o tivessem tratado daquela forma, ele já as teria matado.

"Estamos cientes de que Ceres sobreviveu à última Matança", disse o Rei Claudius. Para Lucious, ele quase nem sequer parecia incomodado com isso, e nem sequer estava com a mesma raiva que o inundava a ele ao pensar no camponês.

Mas, então, Lucious pensou, o rei tinha sido quem tinha sido derrotado pela miúda. Não uma, mas duas vezes agora, porque ela o tinha derrotado através de alguns truques quando ele tinha ido ao quarto dela para lhe ensinar uma lição também. Lucious sentiu que ele tinha toda a razão, todo o direito de levar a peito a sobrevivência dela.

"Então estás ciente de que não pode ser permitido que continue", disse Lucious. Ele não conseguia manter o tom tão cortês e suave como deveria. "Tens de lidar com ela."

"Tem?", perguntou a Rainha Athena. "Cuidado, Lucious. Nós ainda somos os teus governantes."

"Com respeito, suas majestades", disse Stephania, e Lucious observou-a a deslizar para a frente, com o seu justo vestido de seda. "Lucious está certo. Ceres não pode ser autorizada a viver."

Lucious viu os olhos do rei estreitarem-se ligeiramente.

"E o que é que sugeres que façamos?", exigiu saber o Rei Claudius. "Arrastá-la para as areias e mandá-la decapitar? Foste tu que sugeriste que ela deveria lutar, Stephania. Não podes reclamar se ela não está a morrer tão depressa quanto querias."

Pelo menos Lucious entendeu aquela parte. Não havia nenhum pretexto para a morte dela, e o povo parecia exigir que houvesse um pretexto para aqueles que amava. Era ainda mais surpreendente que eles efetivamente pareciam amá-la. Porquê? Porque ela conseguia lutar um pouco? Tanto quanto Lucious conseguia ver, qualquer idiota conseguia fazer aquilo. Muitos tolos faziam. Se as pessoas tivessem algum bom senso, elas dariam o seu amor onde ele era merecido: aos seus governantes legítimos.

"Eu entendo que ela não pode simplesmente ser executada, sua majestade", disse Stephania, com um daqueles sorrisos inocentes que Lucious tinha notado que ela fazia tão bem.

"Estou feliz que o percebas", disse o rei, com um aborrecimento óbvio. "Também percebes o que aconteceria se ela fosse ferida agora? Agora que ela lutou? Agora que ela ganhou?"

Claro que Lucious compreendia. Ele não era uma criança para quem a política fosse uma coisa do outro mundo.

Stephania resumiu. "Seria fomentar a revolução, sua majestade. As pessoas da cidade podiam revoltar-se."

"Não há aqui nenhum ‘podiam’", disse o Rei Claudius. "Nós temos o Stade por uma razão. As pessoas têm uma sede de sangue, e nós damos-lhes o que elas estão à procura. Essa necessidade de violência pode virar-se contra nós facilmente."

Lucious riu-se. Era difícil de acreditar que o rei realmente pensasse que a população de Delos alguma vez os conseguisse aniquilar. Ele já os tinha visto, e eles não eram de provocar um derramamento de sangue. Eles eram uma multidão. Tem de se lhes ensinar uma lição, pensou. Mate-se um número suficiente deles, mostre-se-lhes as consequências das suas ações de forma suficiente dura, e eles, em pouco tempo, ficam em sentido.

"É algo engraçado, Lucious?", perguntou-lhe a rainha. Lucious apercebeu-se da ponta de ironia. O rei e a rainha não gostavam de ser ridicularizados. Felizmente, porém, ele tinha uma resposta.

"É só porque a resposta para tudo isto parece óbvia", disse Lucious. "Eu não estou a pedir para Ceres ser executada. Eu estou a dizer que nós subestimamos as suas habilidades enquanto lutadora. Da próxima vez, não devemos."

"E dar-lhe uma desculpa para se tornar mais popular, se ela ganhar?", perguntou Stephania. "Ela tornou-se amada pelo povo por causa da vitória dela."

Lucious sorriu. "Viste a forma como os plebeus reagem no Stade?", perguntou ele. Ele entendia aquela parte, mesmo se os outros não entendessem.

Ele viu Stephania a fungar. "Eu tento não os ver, primo."

"Mas vais ouvi-los. Eles chamam pelos nomes dos seus favoritos. Eles vociferam por sangue. E quando os seus favoritos caiem, então o que é que acontece? "Ele olhou à volta, meio que à espera que alguém tivesse uma resposta para ele. Para sua deceção, ninguém o fez. Talvez Stephania não fosse esperta o suficiente para vê-lo. Lucious não se importava com isso.

"Eles chamam pelos nomes dos novos vencedores", explicou Lucious. "Eles amam-os tanto quanto eles amavam os últimos. Oh, eles chamam por esta miúda agora, mas quando ela estiver a sangrar na areia, eles vão vociferar pela sua morte tão rapidamente quanto pela morte de qualquer outra pessoa. Nós apenas temos de aumentar as probabilidades contra ela um pouco mais."

O rei parecia pensativo com aquilo. "O que é que tinhas em mente?"

"Se isto não der certo", disse a rainha, "eles ainda a vão amar mais."

Finalmente, Lucious conseguia sentir alguma da sua ira a ser substituída por outra coisa: satisfação. Ele olhou para as portas da sala do trono, onde um dos seus assistentes estava à espera. Um estalar de dedos foi o suficiente para que o homem começasse a correr, mas, em seguida, todos os servos de Lucious rapidamente aprenderam que irritá-lo era tudo menos sensato.

"Eu tenho um remédio para isso", disse Lucious, apontando para a porta.

O homem algemado que entrou tinha facilmente mais do que sete pés de altura, com pele negra de ébano e músculos que se notavam por cima do curto kilt que usava. A sua carne estava coberta de tatuagens; o traficante de escravas que tinha vendido o lorde de combate tinha dito a Lucious que cada um representava um inimigo que ele havia matado num único combate, tanto dentro do Império como nas terras no extremo sul, onde ele tinha sido encontrado.

Mesmo assim, para Lucious, a parte mais intimidante de tudo aquilo não era o tamanho do homem ou a sua força. Era o olhar dos seus olhos. Havia algo neles que simplesmente parecia não compreender coisas como compaixão ou misericórdia, dor ou medo. Tal poderia ter-lhes arrancado membro por membro, com satisfação, sem sentir nada. Havia cicatrizes no torso do guerreiro, onde espadas o haviam ferido. Lucious não conseguia imaginar aquela expressão a mudar mesmo assim.

Lucious gostava de observar as reações dos outros ao verem o lutador, acorrentado como um animal selvagem e a persegui-los. Algumas das mulheres faziam pequenos sons de medo, enquanto os homens recuavam às pressas saindo do seu caminho, parecendo sentir instintivamente o quão perigoso aquele homem era. O medo parecia empurrar o vazio à sua frente, e Lucious deleitava-se com o efeito que o seu lorde de combate tinha. Ele observou Stephania a dar um passo para trás desviando-se do caminho, e Lucious sorriu.

"Chamam-lhe o Último Suspiro", disse Lucious. "Ele nunca perdeu uma luta, e nunca deixou um inimigo vivo. Diz olá ao próximo – e último - adversário de Ceres", disse ela a sorrir.

CAPÍTULO SEIS

Ceres acordou para a escuridão, com o quarto iluminado apenas pelo luar filtrado através das persianas e por uma única vela que cintilava. Ela lutava pela consciência, lembrando-se. Lembrava-se das garras da fera a rasgarem-na. Apenas a memória parecia ser suficiente para as dores voltarem. As costas arderam-lhe quando ela deu meia volta, repentinamente e com tanta intensidade que a fizeram gritar. A dor era insuportável.

"Oh," disse uma voz: "dói?"

Uma figura apareceu. Ceres não conseguia distinguir os detalhes ao início, mas aos poucos, eles foram ao lugar. Stephania estava ali sobre a sua cama, tão pálida como os raios de luar que a rodeavam, formando uma imagem perfeita da nobre inocente, ali para visitar os doentes e os feridos. Ceres não tinha dúvida de que era deliberado.

"Não te preocupes", disse Stephania. Para Ceres, as palavras ainda pareciam vir de muito longe, lutando contra o seu caminho através da névoa. "Os curandeiros aqui deram-te algo para te ajudar a dormir enquanto eles te suturavam. Eles pareciam bastante impressionados por ainda estares viva e eles queriam tirar-te as dores."

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