"Não se preocupe", falou, cedendo. "Eu posso conhecer a nova professora quando vier buscá-la".
Ela se despediu de suas amigas, triste por ter sido arrancada de sua companhia maravilhosa, e se dirigiu para a caminhonete com Daniel.
"Depois, a gente coloca o papo em dia", ela falou alto por cima do ombro, acenando enquanto entravam no carro.
Batendo a porta do veículo, Emily se virou para Daniel. "Lembre-me de não marcar um café da manhã com Amy durante os dias de aula. Pelo menos não até eu voltar ao volante do meu próprio carro!"
Ela sentia falta da liberdade que tinha antes da gravidez. Perder o encontro com a professora a fez se sentir péssima. Esperava que não tivesse causado uma má impressão por causa disso. Ela não queria parecer uma mãe desinteressada, distraída e egocêntrica.
Daniel saiu do estacionamento, indo em direção à cidade.
"Então, quem é a professora?" Emily perguntou a ele.
"Senhorita Butler", Daniel informou. Ele deu de ombros, como se não estivesse prestando muita atenção. "Ela parece um pouco mais severa em comparação à Srta. Glass. Um pouco mais velha, um pouco mais exigente".
"Eu me pergunto o que Chantelle vai achar dela", Emily refletiu. A menina tinha dificuldade, às vezes, em lidar com figuras de autoridade. A abordagem suave funcionava bem com ela, mas a principal coisa para Chantelle era realmente os limites. Contanto que ela soubesse o que se esperava dela, poderia se sobressair. Ela só esperava que essa nova professora, mais severa, tivesse a paciência necessária para chegar a esse ponto.
"Gail estava lá também", disse Daniel. "Ela será a conselheira de Chantelle novamente este ano".
"Isso é um alívio", Emily respondeu, pensando novamente no pai. Chantelle precisaria da ajuda de Gail mais do que nunca. Não só por causa da segurança que Gail deu a ela, mas por causa das experiências de vida pelas quais precisaria ser guiada ao longo deste ano.
"Então, sobre o que você e Amy vão conversar hoje?" Daniel perguntou.
A pergunta tirou Emily de seu devaneio angustiado. "Não tenho certeza, mas acho que sobre Harry. Você notou algo estranho entre eles na ilha?"
"Não", disse Daniel, confuso.
Emily não ficou surpresa por Daniel não ter percebido as nuances do comportamento de Amy. Amy era sua melhor amiga, afinal; ela a conhecia por dentro e por fora e podia ler os menores sinais em sua expressão.
"Espero que não estejam se separando", disse Daniel, sério, ao entrar numa rua lateral. "Estamos prestes a abrir o restaurante. Eu não quero que Harry deixe a sopa salgada com suas lágrimas!"
Emily riu. "Tenho certeza de que não é isso. É provavelmente o oposto, eu acho. Amy está pronta para se casar com ele, mas quer que eu diga a ela que não está indo muito rápido. Você se lembra do que aconteceu com Fraser?"
"Como eu poderia esquecer?", disse Daniel, com uma careta.
Eles chegaram à lanchonete de Joe e Daniel parou. Ele beijou Emily e ela deslizou de seu assento para fora do carro, incapaz de saltar alegremente, como fazia antes de ganhar quinze quilos durante a gravidez.
"Tenha um bom dia no trabalho", ela disse.
Ele sorriu e acenou, depois foi embora. Emily entrou no restaurante.
"Ora, se não é Emily Mitchell!", Joe exclamou quando ela entrou. "Eu não vejo você há muito tempo!"
Ela o saudou com um abraço. "É Emily Morey agora, não esqueça", brincou.
"Claro", Joe riu. "E pensar que vocês tiveram seu primeiro encontro aqui". Ele sorriu. "Café?"
Emily deu um tapinha de leve na barriga. "Descafeinado, por favor".
Joe saiu para fazer uma nova garrafa de café enquanto Emily encontrava a mesa onde Amy já estava sentada.
"Como nos velhos tempos, não é?" Amy disse, saudando sua amiga com um beijo. "Tomando um café rápido antes do trabalho, sempre que podíamos, é claro. Café da manhã, almoço e um drinque à noite".
"Drinques!" Emily exclamou, acariciando sua barriga. "Nem me lembre". Ela riu. "É maravilhoso ter você por perto. E, tem razão, é como nos velhos tempos, só que sem os aumentos de salário ou fileiras de táxis amarelos". Ela sorriu ao recordar a antiga vida em Nova York. Parecia que já havia se passado muito tempo. "Então, o que está havendo?" ela perguntou a Amy. "Como estão as coisas?"
Amy mordeu o lábio como se refletisse se deveria ou não se abrir. Ela nitidamente decidiu não esconder as coisas e foi direto ao assunto. "É Harry. Estamos tendo discussões".
"Ah", disse Emily, com tristeza. "Que chato. Eu sinto muito".
Amy estremeceu e arrumou o cabelo loiro e brilhoso, num corte bob, atrás das orelhas. "É inevitável, não é? A distância. O fato de sermos de mundos diferentes. Quero dizer, eu brinco com as coisas sendo como em Nova York, mas elas não poderiam ser mais diferentes. Eu só não sei se posso me comprometer a morar aqui. Como você fez isso?"
Emily ponderou a questão. "Sinceramente, acho que a cidade de Nova York não tinha mais nada para me oferecer".
"Ah, obrigada", disse Amy, com um beicinho.
"Eu não estou me referindo a você!" Emily exclamou, retrocedendo. "Quero dizer, em relação à carreira e relacionamentos. Minha relação com mamãe era terrível. Ben era um idiota e parecia certo fugir. Vir para cá me obrigou a confrontar muitas coisas. Você sabe, sobre o meu pai e a morte de Charlotte. Só fazia sentido que eu me encontrasse aqui. Então, Daniel apareceu". Ela sorriu internamente ao lembrar quando o conheceu pela primeira vez. Da hesitação que sentiu, da resistência em se deixar apaixonar por alguém novo. Mas os riscos haviam valido a pena.
"Então, basicamente, você está dizendo que eu preciso arrumar uma casa antiga, começar um negócio e me encontrar", disse Amy, com uma risadinha.
"E se apaixonar", acrescentou Emily. "Então, menos um item da lista".
Amy suspirou. "Eu sei. Isso só dificulta. Eu não quero jogar fora o que tenho com Harry, mas não sei se posso ser feliz aqui".
Emily segurou a mão da amiga. "Isso é por causa do que aconteceu com Fraser? Eu realmente não quero que uma experiência ruim atrapalhe. Porque eu tenho certeza que sabe que é completamente diferente desta vez. O que há entre você e Harry é mil vezes melhor do que o que havia entre você e Fraser".
"Será mesmo?" Amy falou, com uma voz tensa. "Pelo menos, Fraser e eu éramos do mesmo mundo. Nós queríamos coisas parecidas. Viagens, carreiras e um patrimônio. Filhos, mas haveria uma babá para ajudar, obviamente. Harry é o oposto disso. Ele é... eu não sei. Rústico? Ele é..."
".... ele é Sunset Harbour", Emily disse, assentindo com decisão. Ela sabia exatamente o que Amy estava tentando dizer. "Mas eu preciso te lembrar que Fraser era uma cilada? Harry é diferente. Ele é honesto, gentil e fiel. Isso é o que você ganha com um homem de Sunset Harbour".
Joe chegou com os waffles e o café de Emily. As duas amigas se serviram e continuaram a conversa.
"A questão é", Amy acrescentou, "você nunca teve que se preocupar com essas coisas. Tipo, você e Daniel não precisaram debater sobre longa distância ou sobre quem iria para onde. Sempre seria aqui. Mas Harry e eu parecemos falar sobre isso sem parar. Poderíamos continuar namorando a distância? Posso realmente deixar minha vida para trás, minha empresa, por um homem? É contra tudo que eu acredito!"
Emily sorriu e suspirou. "Amy, isso é realmente o que está te segurando? Ou é outra coisa?"
Amy mastigou seu waffle lentamente. "Sinceramente, não sei. Estou muito indecisa".
"Você acha que pode estar com medo?" Emily perguntou. "Eu sei que você não se assusta, que você é uma empresária confiante e sensata, mas há apenas uma pequena chance de que talvez você esteja com medo porque Harry te ama e pode ser o homem certo, e que, se você se mudar para cá e correr esse risco, poderá ser feliz?"
"Acho que sim", Amy disse. "Mas não estou com medo de ser feliz. Tenho medo de ser apenas... mais ou menos. De… me entediar".
Ela olhou para Emily com uma expressão de desculpas. Emily sabia que Amy estava sugerindo que a vida em Sunset Harbor era entediante, mas não ligou. Não trocaria a cidade por nada no mundo. Se isso fosse chato, ela preferia a uma vida empolgante!
"Talvez eu devêsse voltar um pouco para a cidade grande", Amy disse. "Limpar a mente. Conferir como vão meus negócios. Lembrar-me de minhas raízes, sabe?"
"Se você acha que vai ajudar", Emily disse. Ela pegou um pedaço de waffle e colocou na boca. "Cara, faz séculos que não vou para Nova York".
Os olhos de Amy se arregalaram. "Ai, meu Deus! Venha comigo!"
Emily olhou para ela, surpresa. "Humm..."
"Por favor, Em", Amy acrescentou. "Podemos passar um fim de semana prolongado juntas. Vou fazer um novo chá de bebê para você, já que o último foi um fracasso".
Emily corou quando se lembrou de como tinha fugido apressadamente do chá de bebê que Amy havia preparado para ela. Ela não pôde deixar de hesitar.
"Por favor, por favor, por favor", Amy continuou. "Você merece uma folga. E a correria do verão já passou. Tenho certeza de que a pousada pode sobreviver sem você por alguns dias". Amy estalou os dedos. "E se fizermos o chá de bebê em Nova York, sua mãe pode vir!"
Amy se encolheu imediatamente. "Ok, agora, eu definitivamente não quero ir", ela disse, lembrando a imensa briga que ela e Patricia tiveram na última vez que se viram. Na verdade, toda vez que se viam.
"Em," Amy falou, com um tom maternal. "Ela será avó pela primeira vez. Quanto tempo vai durar essa rusga entre vocês?"
"Para sempre", disse Emily, sombria. "Você conhece minha mãe, não é?" ela acrescentou ironicamente.
Mas quando pensou melhor, percebeu que havia uma coisa muito importante que precisava falar com sua mãe, algo que não podia ser feito por telefone. A doença de Roy. Ela precisava saber.
"Na verdade", disse Emily, estou devendo uma viagem a Nova York. Talvez minha mãe seja mais fácil de lidar em seu próprio território".
Amy bateu palmas. "Mesmo? Este fim de semana?"
Emily deu de ombros. "Pode ser".
Quando seria um bom momento para contar à sua mãe que seu ex-marido iria morrer? Parecia não haver uma solução para Emily, então, o final de semana que se aproximava era tão bom quanto qualquer outro.
Amy pulou em seu assento, animada. "Será muito divertido. Vou dizer a Harry".
Ela pegou o celular e digitou o número dele. Ao mesmo tempo, o celular de Emily começou a tocar.
Ela o tirou do bolso e atendeu ao mesmo tempo que Amy. Realmente, era como os velhos tempos, quando elas moravam em Nova York!
"É a Sra. Morey?" perguntou a voz do outro lado.
"Sim, quem fala?"
"É a Srta. Butler, a professora de Chantelle. Desculpe incomodá-la, mas houve um incidente. Eu acho que a senhora deveria vir até aqui".
Emily deu um salto. "Que tipo de incidente? Chantelle está bem? Ela está ferida?"
"Ela está bem", respondeu a Srta. Butler. "Foi um incidente comportamental".
Emily franziu a testa. O poderia ser?
"Estou a caminho", disse ela, desligando o celular e jogando-o na bolsa.
Amy estava conversando com Harry ao telefone, mas ela olhou para Emily, usando suas incríveis habilidades multitarefa para manter uma conversa sem palavras com a amiga, sem perder o ritmo do telefonema.
"Chantelle", Emily mexeu os lábios, mas não emitiu nenhum som. "Escola". Ela imitou um movimento de dirigir. Daniel estava com o carro, então, Amy era sua única maneira de chegar lá.
Amy assentiu e apontou para seus waffles. Elas mal tinham comido alguma coisa. Mas Emily sacudiu a cabeça. Ela tinha que ir agora mesmo.
Sem questionar, Amy se levantou, pegou sua bolsa e, ainda conversando com Harry, saiu da lanchonete em direção ao carro, com Emily a reboque.
Enquanto iam, Emily esperava que tudo desse certo entre Amy e Harry, porque era em momentos como aquele, quando Daniel estava ocupado e surgia um problema inesperado, que Emily precisava de seus amigos mais do que nunca.
CAPÍTULO CINCO
Enquanto Amy dirigia até a escola, Emily sentiu seu nervosismo aumentar. Ela odiava quando Chantelle tinha uma crise comportamental, porque parecia que estava dando um passo para trás, e lembrava-a do terrível começo que a garota teve na vida, das cicatrizes que ela ainda carregava, apesar de sua aparência sempre feliz.
"Quer que eu vá com você?" Amy perguntou, olhando para o rosto pálido de Emily no banco do passageiro.
Emily normalmente não mordia as unhas, mas a ansiedade a levou a fazer isso. "Não, não, provavelmente é melhor eu ir sozinha", disse ela, sentindo-se tensa, com o rosto rígido de pânico.
Chegaram ao estacionamento, agora vazio, e Amy estacionou na vaga mais próxima da entrada da escola. "Então, eu vou esperar aqui e levá-la para casa quando você terminar".
Emily já estava com uma mão na maçaneta da porta e balançou a cabeça. "Obrigada, mas não tenho ideia de quanto tempo isso vai levar".
"Como você vai chegar em casa?"
"Depois eu penso nisso. Atrás do caminhão de entregas de Raj? No bagageiro da bicicleta de Cynthia?" Ela estava fazendo piada, mas apenas para tentar conter a angústia.
Amy sorriu ternamente. "Tem certeza?"
"Tenho", disse Emily, empurrando a porta e saindo rapidamente.
Ela fechou a porta e soprou um beijo para Amy antes de subir os degraus de pedra, o mais rápido que sua barriga de grávida permitia. Apertou o botão do interfone e a recepcionista respondeu.
"Sra. Morey", Emily disse, no alto-falante prateado. "A mãe de Chantelle".
Seguiu-se um zumbido. Ela abriu a porta e correu para a recepção. Era a mesma garota do ano passado, Emily percebeu, jovem, sardenta, com um sorriso doce que revelava uma brecha entre os dentes.
"Oi, Emily", a recepcionista a cumprimentou enquanto ela passava com pressa.
Emily percebeu — sentindo-se um pouco angustiada por isso — que ela era bem conhecida na escola, já que a recepcionista a reconheceu e lembrou seu nome.
"Aqui está o seu crachá de visitante", a jovem acrescentou.
Emily pegou o crachá e viu que ela tinha escrito seu nome com um marcador vermelho, em letra cursiva, cercando-o de estrelas. Foi um gesto doce, mas Emily estava nervosa demais para apreciá-lo. Seu foco estava apenas em Chantelle. Mas ela notou o nome no crachá da garota: Tilly. Fez questão de memorizá-lo para que, pelo menos da próxima vez que a visse, esperançosamente, em circunstâncias menos estressantes, ela pudesse ser mais gentil.
"Elas estão no final do corredor, no escritório da orientadora", disse Tilly. "Você conhece o caminho?"
"Infelizmente, eu conheço muito bem", Emily respondeu.
Tilly deu-lhe um sorriso empático e Emily caminhou rapidamente pelo corredor até o escritório de Gail.
Pela pequena janela na porta, ela viu os conhecidos sofás vermelhos, a mesa de jogos, o cantinho da leitura, a casa de bonecas e a mesinha de artes. Ela reconheceu Gail imediatamente, sentada em uma das cadeiras de tamanho adulto, com um coque alto. Havia outras duas mulheres que Emily não conhecia. E Chantelle não estava à vista. Ela podia ouvi-la, porém, gritando tão alto que dava para ouvir até mesmo através do vidro duplo da porta de incêndio reforçada.
Emily bateu rapidamente e viu Gail virar-se para a janela. Através do vidro, ela fez sinal para Emily entrar.
Foi só quando entrou na sala que Emily viu Chantelle pela primeira vez. A criança estava encolhida no canto, chorando desesperadamente, cercada por papel rasgado.
"O que houve?" Emily perguntou.
"Sente-se", disse Gail. "Você já deve conhecer a Srta. Butler".
"Na verdade, não, nós não tivemos a chance de nos conhecer mais cedo", disse Emily. Ela apertou a mão da professora. Era uma maneira terrível de conhecê-la, pensou Emily. Sentia-se uma pilha de nervos e completamente esgotada. "Você falou com meu marido, Daniel".